quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Malak X




Sudoeste de França, 13 000 a.C.

Com o degelo de Verão, descompusemos os quebra-ventos de pedra e, sombriamente, arrastámos até ao vale as tendas. Sentámo-nos a ouvir o rio e as árvores, e porque ouvíamos diziam que pensávamos. Entre nós um homem existe cujo cabelo e a barba espessa eram da cor do Inverno. Estava antes dos outros estarem e as crianças gostam de se aninhar junto dele como debaixo das sombras. Um homem assim é muito raro, quase tanto como eu, que avistara apenas dois desde que o tempo se lembra até ali. As mulheres cobiçam a beleza dos animais, e todos os animais desejam, mais que alimento, ter pele na mulher. 



Sopé dos Montes Zagros, 10 000 a.C.

O homem cedeu ao chão. E o homem cedeu à mulher, porque a mulher deseja o chão como o animal deseja a mulher. A mulher atira o cereal no ar e, deixando-se polinizar pelo solar vento, planta a vida das coisas e faz brotar clareiras nos homens. Então, vai cobri-los de barro e de colmo e os pés dos homens ficam chão. Criam as formas com as pedras e com a água e os homens comem-nas. O sílex da sua foice aterroriza as tribos e os homens, domesticados, domesticaram até o Javali. Mas eu, não sendo homem, e sendo terra, não posso ficar a menos que morra - a história é, literalmente, o cadáver de um anjo.



Turquia, 6000 a.C.

Dos vulcões os homens descobriram os ossos da luz: vi mesmo um espelho. Depois muitos, como flores. E da obsidiana, e do espelho, saiu, gigantesca como o meu pai - porque ao espelho não é o homem que existe -, a civilização. Ainda anormal, ainda muito nossa - sem ruas, apenas escadas e telhados, telhados e estrelas. Quando as pessoas morrem, os corpos são postos em cima de plataformas e deixados ao ar livre, onde habito, longe das cidades, a limpar os ossos.


Horned Wolf

Sem comentários:

Enviar um comentário