segunda-feira, 22 de outubro de 2012

A coroa tem uma necessidade desesperada

Tomas Rucker



Riso ébrio de uma mulher
Paira no ar
Com a toada de uma harpa
A azul voz de um cantor
A cantar

Quando o Sol nascer
Que me não encontre
No acampamento.


Tinha os pés negros da lama seca,
As pernas nuas
Lábios estalados
A companhia de uma rameira de cabelo de palha
Tão bêbada quanto eu
Os seios a jorrar do vestido
E grandes mamilos castanhos

Quando o Sol nascer
Que me não encontre
No acampamento.


Empoleirado sobre a sua cabeça
Martelei-lhe um aro de bronze
Gravado com runas e espadas negras

Quando o Sol nascer
Que me não encontre
No acampamento.


O vinho e a cebola
Subia aos seus olhos pequenos
E caia do queixo carnudo
Com perfumes

Quando o Sol nascer
Que me não encontre
No acampamento.


Horned Wolf

sábado, 20 de outubro de 2012

violet and a warm and a cool brown thrown in

The Legend of the Selkie - Bryce Cameron Liston




A sereia e eu, fiel,
Partilhamos um ensinamento
No bardo azul cantado
Do fundo do mistérico
Mar

Um polvo ilusório levanta-se
A deslizar o coral enquanto sobrevoa
O debaixo azul do reino náutico

Olho para as mãos
Com ofertas marinhas
E lembro-me do tempo
Que saia do limite oceânico
Uma largura de paz

Elegante e graciosa
É a sereia
Como música a soprar
As águas
Mostramos os tesouros
Se fosse rebentação
Aves de pesca e brisas de sal
Colocando-nos debaixo da cachoeira
De Lua a escorrer. A sereia
Adorna-se com pianos:

Dorme tranquila e pacifica
A rebentação é um sossegado
Pensamento,

A descansar no chão do abismo
A vagar um oceano de sonhos.


André Consciência

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Junto do portão de lama para se despedirem



O dia frio
Cinzento e
Húmido.

A manhã inteira a chover
Mesmo depois da chuva parar.

Não chegaram a ver o Sol
Na arcada das donzelas
Ouviram o Bardo Azul cantar.


Horned Wolf

terça-feira, 16 de outubro de 2012

A Dualidade Persistente

Hans Arnold



Peculiar, que a esperança e desespero
Venham a ser
Como destroços em beleza

Mas há mais a seguir
E o ego a persistir -

Assim ergue o que resta
Destes troféus em ruínas
Lança mais um fósforo ao amontoado
De ramos embebidos em vinho

O ego resiste e insiste --

Como se abandonado
Entre flores que murcham de um
Jardim ao Norte voltado
E todavia o frio e a penumbra
Sem incomodar jamais
Deste ponto o lar é vista
De onde estou, até os tijolos
Vibram com conquista.

De vez em quando
A janela aberta atravessando
Ouço vir música


Mermaid (R.I.P.)
Tradução André Consciência

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Templo No Cume da Noite

The Siege and Relief of Leiden - Erwin Olaf



Imensos arcos cinzentos do rio doce ladeavam-no. O som da sua língua reverberava pela lagoa e pelas enormes torres quadradas, atenuado pela distância, mas ainda suficientemente forte para abalar as cidades adormecidas. "Aprende três coisas novas antes de voltares", dizia aos seus visitantes. Eles faziam-no sempre, por vezes não passavam de três palavras novas sem língua, histórias que não haviam encontrado ninguém para as contar, ou maravilhosos e estranhos acontecimentos do vasto mundo que se estendia para lá do homem amável: chuvas, guerras, sapos a eclodir. Adivinhas, truques de mágico, anedotas, segredos. A cada segredo que lhe contavam o homem amável enchia-se de mais nevoeiro, uma nova máscara aparecia numa nova parte do corpo, e novos suspiros assolavam os velhos ossos. A rapariga que era a sua visitante no presente sabia-lhe um rasto que datava um século, embora o homem afirmasse que eram três os que tinha em si. Este surgira do ventre de escravas, prostitutas e sémen de ladrões, era um filho bastardo que escapava. Viera de meia centena de terras até ali em busca de refúgio, meia centena de deuses vieram com ele e todos eles estrangeiros. Por vezes aparecia como uma cabra preta, com um leão cuja pelugem era a noite. "Toda a humanidade me pertence. Caso contrário, algures no mundo haveria um povo que viveria para sempre. Conheces algum povo que viva para sempre?" Perguntava à rapariga e a rapariga ficava a sonhar com o dia em que a névoa dos segredos revelados o escondesse. 

Horned Wolf

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

A longa sombra farpada

Jose Del Nido


Quatro irmãos jantam em quatro longas mesas. As mesas estão decoradas de três diferentes tipos de peixe, caranguejo guisado, mel vindo das colmeias, barro cheio de manteiga, pães de forno. Proferiram uma prece antes da comida ser servida, e tocaram harpa vertical, enchendo a sala de sons suaves e doces, o alimento intocado, só para os anjos.

Lá fora, quando as chamas morreram, uma pobre mulher havia sido violado uma dúzia de vezes, os seus seios tinham sido rasgados, mastigados e comidos.


Horned Wolf 

A mulher dos moinhos de vento

Jose Del Nido


Uma veste cinzenta adejava em volta das suas pernas descarnadas, pele enegrecida mostrava os locais onde as chamas a haviam lambido, mas o tempo e a chuva extinguiam essas marcas. Leões, fumados com cinza e azul, perfilhavam o pavilhão, de olhos carrancudos. As paredes continuam despidas, e ela também. Espero um dia cobri-la com tapeçarias, cenas de piedade e devoção. A nossa janela dá para o bosque sagrado. Lágrimas rolavam-lhe dos olhos castanhos como o bosque e a Serva Branca ladeava-a sem dormir há uma quinzena, durante a qual os cavaleiros vagueavam pela mata de chuva lá fora. A Serva branca era uma mulher que usava só um olho, coberta por manto e capuz. O olho que lhe restava era terrível de contemplar, e as suas faces rasgadas e cheias de cicatrizes. A mulher dragão enrolou uma trança no dedo, estava a corar por baixo das lágrimas. Os criados estavam a trazer um prato de peixe, um lúcio cozido numa crosta de ervas e nozes moídas. Dela, os dedos pálidos acariciaram o ar enquanto na arena, os infiéis eram devorados por areias movediças e lagartos-leões. O resto é ossos e cinzas, uma vila inteira. Cães acesos como archotes corriam-na sem cessa. Eu estava descalço, vestido com uma túnica simples de lã não tingida que me fazia assemelhar-me mais a um pedinte do que a um lorde. Lá fora não haviam pardais, só árvores nuas a cismar, com os ramos negros a elevarem-se no telhado vítreo do céu. Um tapete de folhas mortas rangia sobre a minha cabeça. Sempre que fitava a mulher, recordava que as vidas são como chamas de vela, qualquer aragem vadia as pode cessar.  

Horned Wolf

Fazei soar os campos

Jose del Nido


O seu olhar foi atraído para a donzela sem boca com o cabelo soprado pelo vento e braços ao peito. Um homem de lábios azuis e sem nenhum olho tinha uma rapariga bonita e roliça de dezasseis ou dezassete anos ao colo, descalça e desgrenhada, com os braços envolta do seu pescoço. Sentiu o cheiro do mar que entrava pela janela aberta, embora o quarto fedesse a vinho, sangue e sexo. O vento entrava em rajadas pela nudez. A sombra da tarde caia, como um licor que fosse preparado por magos. Os homens são carne, e a carne come a carne. Descobrirei uma mulher dragão, a mais bela mulher do mundo, para mim.


Horned Wolf

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Animula Vagula - A NOITE EM QUE A ALMA DO VERBO VAGA


André Consciência, autor português de "À Beira-Lua" e "Espinhos Sem Morte" interpreta teatralmente poemas exclusivos com ilustração sonora da sua própria autoria sob o nome de Babalith.


"As asas feriam-me o corpo, não paravam de crescer
Em tantos lugares, as asas, arrastavam-me pelo chão,
Nos lugares do vento, contra mulheres despidas e homens
Desarmados."


Andréia Carvalho, poetisa brasileira, autora dos livros "A Cortesã do Infinito Transparente" e "Camafeu Escarlate" encarnará os seus feéricos poemas fazendo-se acompanhar da sua contagiante videoarte.

"quando soror noite apócrifa, inúteis o credo e o terço.
em coma ilusória,
quiróptera, lua de hóstia:
nigroresplandeço"



Entrada:
5 Euros

Cruz Redentora



As ratazanas infiltram-se
Nas mãos, nos olhares
Nas arestas do amor
E as pessoas agitam-se
E gemem em volúpia por tudo
Se perder.

Horned Wolf