quarta-feira, 25 de julho de 2012

Vénus Desarma Cúpido



Não sabia o que desejar, tal como não sabia o que esperava sob aquela luz distante. Os flocos pairavam com a suavidade e o silêncio da memória, cobrindo a erva, salpicando de branco os arbustos e as estátuas e inclinando os ramos das árvores. A neve doía-lhe naquela manhã. Partira com os flocos a turbilhonar à sua volta para ver o grande e vasto mundo. Da mesma forma, a esposa deixou as portadas abertas enquanto se despia. Despiu um manto de raposa branca, luvas de couro, botas atadas a nível do joelho, dois pares de meias para as pernas, o vestido de lã azul, e a roupa interior de seda e linho, quando a neve começou a entrar pela janela. Sustive a respiração, sem desejar perturbar uma beleza tão perfeita. O silêncio fantasmagórico caía e caía, e acumulava-se numa camada grossa e contínua no chão. O mundo tinha fugido de todas as cores. Era finalmente negro, cinzento e branco. Um mundo puro. Flocos de neve roçavam o rosto da estátua da Mulher Chorosa no centro do jardim, com a leveza dos beijos de um amante. Viraram o olhar para o céu e sentiram a neve nas pestanas, saborearam-na nos lábios.

Horned Wolf

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