quarta-feira, 28 de setembro de 2011
Cavalos. Visitantes. II
Ouvi-la-ei chamar-me na pulsação do sangue
No premente bater do coração.
Sob os sombrios carvalhos onde estávamos
Tudo era sombra e imobilidade,
As luzes coloridas brilhavam difusamente
E a música zumbia.
A imundice dos campos
Seguia-nos a medo
No cacarejar de uma velha.
Uma confusão de pés no relvado
Alguns descalços, outros calçados.
De novo, à sombra do vidoeiro sem folhas
Encostada a um tronco, com a roupa despida
Na erva estendida.
Uma a uma, as minhas memórias
Entraram nos trenós e começaram
A deslizar pelo gelo,
Correndo contra os primeiros alvores
Do dia.
O Inverno começava a clarear,
Trémulo de exaustão,
Com o corpo coberto por uma camada
De gelo.
Do meu peito saiu um grande soluço.
Horned Wolf
Cavalos. Visitantes.
Sobre um lençol de gelo negro
Os nossos acompanhantes vinham de trenó
Com longos nomes de estrelas e
As suas luzes a surgirem da bruma.
Uma teia de aranha ao vento
Dançava com as mulheres leves.
Mais à frente
O conjunto de peixes mortos
Tremia com
Sentimentos afectuosos.
Horned Wolf
Os nossos acompanhantes vinham de trenó
Com longos nomes de estrelas e
As suas luzes a surgirem da bruma.
Uma teia de aranha ao vento
Dançava com as mulheres leves.
Mais à frente
O conjunto de peixes mortos
Tremia com
Sentimentos afectuosos.
Horned Wolf
sábado, 24 de setembro de 2011
Frio
As margens do rio que as chuvas recentes
Fizeram torrente castanha e espumosa.
Pousei a cabeça na mão, com o meu
Suspiro, com a minha... caligrafia.
O frio entrava por cada frincha
O vapor de água saia-me pela boca.
Os outros bebem com a sua pele
Cor de cera e os seus olhos mortos.
Uma sentou-se e ficou a observar
Com olhos sonhadores
Ao som dos fragmentos de gelo a deslocarem-se
Na água, e do pio solitário de um mocho.
Eu fiquei à espera.
Horned Wolf
sexta-feira, 23 de setembro de 2011
O Padrão da Noite
Orla de Floresta - Courbet
Criaturas de todas as formas e feitios
Pegavam-nos pelas pequenas mãos e ensinavam-nos
Os passos.
Na floresta sem fim, algumas árvores
Tinham o teu perfume, outras o meu
E o arvoredo, odor conjunto.
Depois, sabíamos os passos
De cór,
Sentávamo-nos sobre as árvores
A cada Lua Cheia, e olhávamos
A nudez a brilhar, e tocávamos
A água prateada da pele
Com os movimentos
Emocionais
De escorrermos no astro.
Quando a Lua estava mais alta
Quando a Lua estava mais alta
E viamos por entre os ramos
Dos carvalhos mais altos
Vislumbravamo-nos na orla
Da floresta.
Horned Wolf
O Vôo
Um músico aspira
À composição que será capaz
Apenas uma vez na vida.
Os nossos pés
Aclararam perto
Do chão das folhas.
Caímos, os pulsos
Percorridos de velocidade
As faces rubras
A romperem o Sol
Com sangue
À sombra das árvores.
Era uma música
Que continuaríamos a ouvir em sonhos
Que continuaríamos a ouvir em sonhos
Vidas depois
E nos cobriria a solidão
Do seu percurso
Com capas vaporosas.
A Clareira da Dança
Tinha as suas próprias
Regras.
André Consciência
Dentro da Mata Virgem
Um dia, colocado frente ao comboio deslizante, para enfrentar a morte, senti, antes do segundo que aproveitei para escapar do embate, o mundo estarrecer e parar todo, comigo incluído. Depois, o corpo tremia e a mente sem ventos. Descobri que a sensação de se estar frente a frente com a morte é exactamente a mesma sentida, daquelas duas vezes, em que durante as minhas evocações de magia cerimonial as criaturas trouxeram aparição em peso, carne e osso, a respiração paralisa, a minha e a da natureza nas redondezas - e mesmo o coração desvanece para o silêncio do trovão.
A ti não te evoquei, embora te pressentisse desde que me lembro de ter nervos nos veios do tempo. Os nossos olhos cruzaram-se num bar e eu revi-te de frente para traz no horizonte dos dias. Descobri, só depois, que a tua nudez, a tua em específico, apresentava para mim os sintomas relatados no anterior parágrafo, mas em que se conseguia, dentro daquele estado, gradualmente, respirar, e que o coração despertasse e se vivesse e fluísse naturalmente no interior do próprio samadhi.
Quando, ao nos encontrarmos, deixámos de pensar no ruído lá fora, fizemos o nosso jejum, de comida e de sono, e adereços semelhantes que interferissem com a água que somos a fluir um no outro. O teu olhar silencioso, belo e misterioso enchia, pouco a pouco, o ar de melodia e doce murmúrio. Enxames de pequenas criaturas brilhantes, que não eram fadas nem insectos, e muito menos pássaros, mas estrelas cadentes, mergulhavam, desciam e subiam, como a humidade das nossas almas a derreterem-se (expandirem-se) uma à outra. Ensinei-te o preço da minha nudez enquanto metafísica. Respirámos para dentro um do outro, com uma mão na nuca e outra no sexo, enchemos-nos como sóis que se reflectem mutuamente, os animais nocturnos entraram em alvoroço e, calando-os e até as estrelas, fizemos amor.
Quando voltaste, sozinha, a passear o rio que ladeava o mato, viste nadadoras com grandes olhos luminosos, mãos despidas, pernas voluptuosas e peles brilhantes, com olhares sempre virados para cima, para a superfície, estendendo graciosamente os braços brancos para a margem de uma ilhota ou de um salgueiro. Todas tinham a tua figura.
Horned Wolf
A Lua Apaga as Luzes
Dura os caminhos em que abre
As portas.
A Lua dependura
Os corações
De pernas ao alto.
A Lua torna
O Tempo da Morte
Em Espaço Brilhante.
A Lua é uma orgia de fadas
Em que bebemos a sede
E desorientados fitamos a fome.
Está frio
E no frio que está
As mulheres e os filhos
De todas as famílias
Congelaram.
André Consciência
quarta-feira, 21 de setembro de 2011
Prodígios
Andrei Chikatilo
Um poema que não fala de vento
Nem de vozes limpidas,
Ou de dormir nunca mais.
Um poema que não fala das árvores
Perdidas na saliva das ilhas
Nem das entranhas do mar
Que desprendem.
Deus não é eterno;
A metamorfose ignora-se;
Os fundos dos restaurantes olham;
Hoje, definitivamente, não chega,
Nem a próxima noite;
Os ossos são a única parte tranquila
Do corpo;
A sombra envolve-se
E se não fosse a música
Tinha um tiro nos cornos.
Levanto a cabeça e deixo a voz baixar.
Um duende dança na erecção do meu pénis.
Horned Wolf
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Casa de Treva,
Vozes da Encruzilhada
terça-feira, 20 de setembro de 2011
Morte a Saldo
O coração rechassado para longe do cais
Das auroras. Ficaste a beber, com gestos
Repetidos, a tristeza do rosto pelos
Lábios. A febre, engrossada com a seiva
Dos cedros acima, até que tocavas o corpo
Da morte. A luz um véu, a esperança, um
Horror sinistro, ilegível lâmpada
Arbusto estelar, ah, mil putas sufocam
Sob o jugo das minhas asas: relógios
Agitados pelo fim. Este poema, do que fala?
Do que fala este poema do que fala?
Os olhos, fustigados de mistério assombroso
Que há no bolor fumarento do tédio;
O ar!, que sufoca e paralisa numa torrencial
Euforia; Centenas de putas desfiguradas
E já sem nome, misturam-se na cicuta que abeira
O precipício da beleza do teu corpo:
Disse.
Os jornais, repletos de letras em merda
Inscritas, avançam pelo dia como barcos.
O mundo não deixou de ser
Outro dia qualquer
Após a miríade de irrelevâncias
Intransponível.
Horned Wolf
sábado, 17 de setembro de 2011
Nação Fantasma
Chegava um triste lamento
O ar das correntes e a picada gélida
A aceitarem a brisa libertadora.
Depois, a extensão de terra desolada
Que contorna o Ocidente da Espinha do Mundo,
Norte, Leste, uma canção interminável
Enchia-me os ouvidos.
Ouvira-a a cada segundo que ladeara
A cadeia de mares, a visão das vastas
Montanhas. As praias, quando caíssem
As primeiras neves.
No primeiro dia em que me afastei
Da Espinha do Mundo, as carroças solitárias
Punhados de cavalos sem cavaleiros.
A fraqueza puxava o Sol baixo no horizonte.
As estradas de ébano, mantinha o capuz
Baixo, soltava um ligeiro aceno de cabeça
A cada ruína.
O pico dos lagos rochosos dominava
A região coroada, no curto Verão, da queimadura
Na neve.
Uma bandeira ondulando, desafiadoramente,
Contra o forte vento.
Horned Wolf
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