O mundo era natural para mim, eu estremecia e nos não tínhamos conhecido, era natural a morte, as mulheres, a sede e o deserto, as feras que se passeiam na areia indiferentemente próximas ou longínquas. Mas demorava-me nos pormenores e encontrei uma porta azul nas ruelas daquele bairro que fazia meu. Essa porta ainda estava fechada no tempo, no entanto, vi-me junto das retortas do clarão da água, junto de ti que cantavas o mar por lhe sentir a falta, e parecia que nunca tinhas levado ali ninguém. Desconfiado, enquanto fitava o pequeno prédio de fora, aumentei-me imenso, para me poder espreitar a sair pelas janelas como um incêndio. Nascia um teatro honesto, uma vida além da morte em que salões eram montados para receber a última nas suas pálpebras azuis de dia e multicoloridas pela noite. Subi só meio degrau, quase insensível, a confiar na sensibilidade do homem artista e afogado na tua pele que ainda desconhecia. As visões de fora e as visões de dentro todas a colidirem como um pesadelo: Um coelho subia a porta azul e uma chama diante das janelas projectava o Sol, o Sol iluminava igrejas só habitadas pelos gongos e o tinir dos sinos estremecia sobre os vales rochosos onde se movia a sombra do peixe maior. Uma torre enorme erguia-se reunindo avalanches em seu redor e nós nadávamos despidos na neve, com pétalas de rosa a brotar das gengivas encarnadas.
Retomei o meu percurso. Então reparei, pela primeira vez, que nada se pode dizer sobre os lugares.
André Consciência
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