quarta-feira, 30 de setembro de 2015

A Vela Intermitente





Ele:

Ninguém me veja. Sugo o mel das colmeias, os raios do Sol, roubo os primeiros risos dos bebés e cubro-me a mim com um manto se adormeço. No Samein as raparigas chegam com risinhos e faces rosadas, coroas de louro, bolos e leite fresco. Abraçam-me acaloradas, lançam-me elogios sem sentido, oferecem-me laranjas e partem. A caminho, as bocas das borboletas terão os seus filhos, as mulheres chegarão a casa chorosas e de joelhos sujos, devorarão um bago de amoras e deixarão ao cacimbo da alvorada a porta aberta para mim. 

Ela:

Uma estrela caiu e deixou a noite sem Lua, um beijo lançou-se na chuva. A voz de Lorca morreu numa esquina e no largo ouvia-se a poesia sensual das línguas romanas. Alguém bebeu e conversa vestido de andrógino sobre o significado da vida, sobre a Escandinávia e os seus castelos, na vila abandonada. Ela tem meias rendilhadas acima do joelho e fuma antes de entrar no casebre, repleta de romantismo alemão, de agressividade passiva, de perfeccionismo e sarcasmo afectuoso. Chopin nos fones, Salvador Dali no Tablet, uma ficção de distopia no bolso e um desejo de voltar a sangrar da virgindade.

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