quinta-feira, 30 de agosto de 2012



Respiro cores quando me visito
mas visitar-me tornou-se ousado
Expandi, enlouquecendo
estou afogada em luz, já não vivo aqui
sorrio com todo o meu corpo
visitaram-me
e tudo se tornou real em mim
não preciso mais procurar os meus olhos
Mil pássaros me voam
para onde vou não há forma de compreender


Soraya Moon

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Praça do Bocage




Conversam sobre a vida
E a vida parece assim
Ligeiro assunto
Mas conhecem, todos,
A eternidade passageira
A alma em retalhos.

No conforto do lar
Reflicto depois, abrindo a asa
Que me sobra da outra asa
Nada importa,
Nem se a vida surge viva
Ou morta:

Tudo o que há
É o que passa
E o que passa
Fica, como uma praça
Onde conversam sobre a vida
E a vida parece
Que amanhece.


André Consciência

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

And Death Shall Have No Dominion





Defuntos nus fundir-se-ão
Com a lua a poente e o homem do vento;
Quando os seus ossos forem limpos e os limpos ossos varridos,
Haverão estrelas onde haviam pés e cotovelos;
Ainda que enlouqueçam serão sãos,
Ainda que se afundem no mar deverão emergir;
Ainda que se percam amantes não se perderá o amor;
E a morte não dominará.

E a morte não dominará.
Sob as dobras do mar
Aqueles que há muito jazem não perecerão ao vento;
Contorcendo-se desesperadamente enquanto sem romperem
Acorrentados a uma roda, os tendões cedem;
A fé nas suas mãos fender-se-á,
E os males unicórnios atropelam;
Em todas as extremidades rachadas estão ainda intactos;
E a morte não dominará.

E a morte não dominará.
As gaivotas não tornarão a chorar aos seus ouvidos
Ou as ondas a quebrar alto nas costas;
Onde uma flor desabrochou nenhuma outra flor
Erguerá a cabeça às investidas da chuva;
Ainda que estejam enlouquecidas e mortas como pregos,
As suas cabeças martelarão as margaridas;
Irrompem ao Sol até que o Sol se rompa,
E a morte não dominará.


Dylan Thomas
Traduzido por André Consciência

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Dentro do Fim

I

A vida acaba cedo
E prolonga-se tarde demais
Gostava de viver noutro tempo
Noutra terra, partir de outro cais
Onde o teu nome gravado
Não fosse um nunca mais...


II

É de manhã
Tive de vender o carro
Por 150 euros.

Lembras-te das nuvens
Como eram
Nas outras manhãs
Perfilhadas como corredores brancos
Por dentro do teu carro
Com bancos recolhidos
Onde nos deitávamos sobre nós
Com mais que sentidos?


III

Dói-me existir
Sem a dignidade possível
Dos primeiros momentos.

Os pássaros voam sobre as carcaças translúcidas
Das nossas almas pouco lúcidas
Que se lavam nas margens de beijos,
Ou de mulheres abertas com filhos
E homens que choram em brilhos.


IV


As luzes na penumbra dos aguaceiros deixam-me morrer menos sozinho.

Ninguém me lembre, tudo o que eu fui não foi caminho.


André Consciência