sexta-feira, 27 de março de 2009

Interview with "The Papah Female"

"Desire to Ascend"
To taste the light
is the gift of darkness.

Picture from: Phallucifer Babalith
Credits to LuneBleu




Q: Hi Phallucifer, how are you doing today?

P. B. I’m just fine, thank you.

Q: I have some questions for you. Let’s start with your motivations, what are your major sources of inspiration?

P. B. It’s the same with “The Cathedral of Papah Female” album and the “Puscifer Baphomaat” gallery, on weekends I watch the pigs fighting in the mud, biting the trees and I meditate on men living on the city, then I focus on one particular man/woman-pig and I start the artwork process. The “Magickal Maa” music project deals with many different aspects, but I meditate on leaves rotting, they smell much better than human corpses.

Q: I gather that sex is a constant theme on your work. How do you deal with sex and the erotic?

P. B. I believe sex has become a bad thing, and people will always find many ways to face it, because they can’t run away from it. Most of the time they kneel to it and become raging animals. That is nature. Art is my nature. I don’t like women, and I don’t like men. In fact I pretty much hate them, I’d rather have myself filled up with a goat phallus. I deal with sex mostly through art, and I like to bite myself and to bite pretty girls in sensible places. Now as to what should have been happening, the church has a particle of sense and reason there, just as the pagans do, sex should be a celebration of

1 – Freedom

2 – Love

Sex is not a celebration of freedom nowadays, just look at all the bondagers, terrorized by their sex urges, crouched till they become insignificant pricks.

Sex is not a celebration of love nowadays, either, just look at all the couples: they don’t want children. To have a child is more than to bring unto the world another stupid beast, to have a child means the ultimate sacrifice, the one that claims and ascertains that love and care is above all the little caprices of the vile people.

I can satisfy myself with the dead because the dead represent the body surrendered to love, a corpse doesn’t look back, the eyes of a corpse are still, totally in the moment, surrendered.

Mortal men should only let go when in the arms of either Love, or Will, everything else must become tallness through resistance (sex is a great training ground for such a discipline). True anarchism has nothing to do with disorder and punk behaviour, but everything to do with resistance and integrity.


Q: And what about you?

P. B. I am not a mortal man, because I was never born, I was made up and am, therefore, similar to the metaphysical beings that populate the myths. I have no resistance because I am like a river, a creating and a creative force.


Q: I can understand that you have some influences from philosophy, literature and the esoteric sciences, who are your so called “masters” on this playground?

P. B. The problem with philosophy, literature and the esotericism is the self imposed questions, people shouldn’t question themselves, this divides them and makes them weak, it is an affirmation of self doubt. We, as individuals, are the answers, and we evolve by answering others. If we are to put questions, in order to exercise our intelligence, we should do so to others, to understand others. As soon as you fall from this bridge you are to think of dignity first, because your sense of dignity will be that same spot where you left yourself behind. Now stop making stupid questions, please, I have no masters, never will, and I worship everything.

Q: OK, the interview has come to an end. Thank you very much Phallucifer.

P.B. You are welcome. Good bye and may you all be raped by life.




* Algumas das músicas de Phallucifer Babalith podem ser ouvidas aqui.

** Entrevista feita por Horned Wolf.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Speech for Deaf Citizens

O mundo, sobre nós, agiganta-se.

E a nossa pequenez alastra-se.

A canção da manhã escapou-se através do nosso silêncio.

As ruas continuam, e as gentes que as populam, os risos ordinários.

Eu fui sepultado, na cova da tua boca.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Gothic Siamese




Lembram-se delas?
Sempre de mão dada, nunca eram vistas na rua sem ser juntas, e os vultos de mão dada.
Era nas ruas de Lisboa.
Quem falava no gótico falava sempre nelas, e lembrava-se dos seus beijos junto à fonte.
Ainda no tempo da vanguarda.
Será que hoje vivem?
Onde se terão os seus vultos escondido? E será que, seja em que abismo for, as mãos ainda caminham uma na outra?

De certeza que alguém se de lembrar, nas ruas de Lisboa, juntas, elas conquistaram o mundo inteiro, contra o mundo inteiro.



* Imagem de Jessica Walker

**
Cliquem para a primeira festa MOP de 2009, a acontecer amanhã.

terça-feira, 24 de março de 2009

Julius Evola




Para mim a integridade, existe naquele ponto em que os praticantes de artes marciais pressionam os músculos do plexo, e tomam consciência de todo o seu corpo. A Integridade tem de vir do centro, e de ser o centro.

Julius Evola foi uma das minhas maiores influencias no passado, mas esse senhor é dos esoteristas e dos escritores mais manipulativos que já li, quando parece estar a referir-se a uma virtude do espírito, está, na maioria das vezes, a encerrar o homem numa masmorra de grilhões bem preparada, cheia de ideias reforçadas, fascinantes e ofuscantes. Não é uma masmorra escura e aberta aos sentidos como alguns outros gostam de fazer. É uma masmorra cheia de luz artificial que se insere nos olhos como um vírus.

Existe algo de inabalavel de facto no espírito, mas a sua manifestação nos mundos inferiores efectua-se por via de férteis combinações de uma arte espiralica.

É, pelo que me parece a mim, contra as leis da aprendizagem a ideia fixa, e a fide ou a fé aos princípios morais quer do individuo, quer da sociedade, é trocar a Palavra pela palavra: um dom muito presente em Evola.

O problema de Evola é que vem a ser levado de uma forma demasiado politica, ética e moral, e a politica, a ética, e a moral, formas menores de influenciar (menos do que expressar e tocar por mérito do vislumbre espiritual), será sempre lixo agarrado aos ciclos, à mentira da horizontalidade, e à corrupção humana.


PS:
Esta critica afasta-se dos ultimos trabalhos de Julius Evola.
A comprovação de um mestre, que foi sempre mestre, está nos ultimos actos.

segunda-feira, 23 de março de 2009

O Romantismo



"Death stands above me,
whispering low
I know not what into my ear;
Of His strange language all I know
is, there is not a word of fear."

Walter Savage Landor


1 - A valorização da manifestação individual; a capacidade do ser humano se ensinar e se construir a si próprio por intermédio da sua interacção consigo mesmo e com o mundo; e, porque procura ver no mundo uma extensão da sua alma.

(... A possibilidade de se fazer do mundo uma representação coerente não retira nada ao facto de o mundo tal como é em si mesmo não ser o mundo tal como se reflecte no espírito humano.... Nada pode, fora do próprio ser humano, decidir do que será a sua opção de homem ...
Kant)


2 - A auto-analise por via da emoção exprimida e levada a confessar-se em detrimento do recalcamento.
3 - A defesa da liberdade, da vida, do amor e da luz.
4 - A busca das origens e o combate à corrupção social a favor da pureza e do estado de inocencia humana.
5 - O respeito à infância, à nação, à tradição (que caracterizam o individualismo grupal e individual, e potencia a contribuição de cada sub-grupo num panorama mais generalizado).
6 - O Romantico é um teórico do irracional, exprimindo-o por via da ciência das letras, tendo presente o espirito literário, brindando a besta de inteligência e dando-lhe uma via de criação/recriação metódica.
7 - A insatisfação do indivíduo com o mundo que o circunda, a sua revolta contra a ordem estabelecida e estagnante, o caracter da sua rebelião social, politica e metafisica.

(... "Sobre a bandeira romântica, leu-se esta tripla divisa: liberdade política, religiosa e literária", escreveu F. R. de Toreinx em 1829; Goya considerava Satã o Deus do Romantismo)

8 - A materialização da tendencia vertiginosa em direcção ao infinito, ao outro, ao divino.
9 - O acto poético como êxtase derivado da inconsciência, a dissolução do ser no seu próprio mar primevo de esquecimento, abandono e criação, revelando novas realidades.
10 - A fertilização por parte do mundo exterior (chamado real) no interior (chamado de sonho) e do interior no exterior, revelando com naturalidade a impressão da alma na natureza, por via do mito.
11 - A valorização da dualidade espelhada na sua imagem unificada por via da arte: prazer/dor, beleza/horror.

(Novalis afirmava que a crueldade provem da volupia assim como a religiosidade, Hugo escreveu "A Morte e a Beleza são duas coisas profundas (...) Duas irmãs igualmente terríveis e fecundas")

12 - O gosto pelas enganadoras mascaras da forma, tão sedutoras no seu amor, implorando, em cada manifestação, serem tomadas pela Luz que nunca se afecta; brotando eclipses nos cegos.

"... o pintor evocará na paisagem o prolongamento da sua melancolia ou dos seus sonhos. Não se tratará realmente de um programa nem da observação directa de um sítio, mas da escolha de elementos eleitos em função do seu valor sentimental."

domingo, 22 de março de 2009

O Dever da Bondade

Anjo em brancos trajes,
Que absorvam estes lábios
A fragilidade na decadência.

sábado, 21 de março de 2009

A Fome das Hienas






“O estado, eu assim o digo, onde todos, os bons e os maus, são bebedores de veneno; o estado, onde todos, os bons e os maus, perdem a si mesmos; o estado, onde o suicídio lento de todos é chamado de ‘vida’. ”

“Sim, uma morte para muitos aqui foi tramada, uma que se glorifica e se honra como se vida fosse: deveras, é um serviço entusiástico para todos os pregadores da morte!”

“Rumo ao trono todos eles se esforçam: é sua loucura – como se a felicidade sentasse no trono! Frequentemente a imundície e a vileza sentam no trono – e, frequentemente também, o trono se assenta sobre a imundície e a vileza”

“Loucos eles todos me parecem, macacos em escalada, vorazes e repulsivos. Para mim, cheira muito mal o seu ídolo, o monstro gélido: cheiram mal eles todos, esses idólatras”.

- Friedrich Nietzsche



I

A O.T.O. passou por Carl Kellner, Reuss, e Crowley, o ultimo transferiu o cargo de O.H.O. a Germer e documentos a McMurtry para que este pudesse tomar a OTO em caso de emergência. Germer, na sua morte, não deixou descendentes. Em respeito às propriedades da OTO deixou-as em testamento à sua esposa, Sascha, e a Mellinger. McMurtry só foi avisado da morte de Germer anos mais tarde e sucedeu-se um grande atraso nos assuntos da liderança da Ordem. Metzger procurou então proclamar-se Outer Head, Mellinger, o seu mentor, não estava sequer ciente disto e a publicação de afirmação como O.H.O. de Metzger foi enviada a Wilfred Smith, que estava morto! Metzger não era aceite, Sascha tentou enviar os direitos de propriedade do seu falecido esposo ao ultimo mas estes foram bloqueados por Mellinger que denunciou Metzger como fraude. Metzger então ocupou-se com a Ordo Illuminatorum. Kenneth Grant também tentou a sua sorte, mas segundo ele a OTO já não concede graus cerimonialmente e abandona a Missa Gnóstica (a cerimonia principal). Quando McMurtry percebeu a situação assumiu-se como líder da O.T.O. tendo como testemunhas Israel Regardie e Gerald Yorke. Então começou a reconstruir a O.T.O. convidando os membros antigos sobreviventes. Entretanto, Marcelo Ramos Motta, sem legitimidade dada para ser Cabeça, decidiu que era o sucessor de Germer e, não fora sequer Iniciado formalmente na O.T.O., porém na A.:A.: Formou então um grupo da O.T.O. no seu país, o Brasil. Por fim decidiu processar Weiser (um publicante de Crowley) porque só ele tinha os direitos da O.T.O. Samuel Weiser ganhou em tribunal, e o Juiz nem sequer reconheceu a O.T.O. de Motta como legal. Mas o tribunal reconheceu a O.T.O. de McMurtry como a continuação legal da O.T.O. de Crowley. Em vez de nomear um sucessor McMurtry desejou que este fosse escolhido por votos e após a sua morte sucedeu a O.H.O. Hymenaeus Beta, presente ainda hoje.


II

No início, com Kellner, a entrada no círculo interior da O.T.O. tinha como pre-requesito graus altos na Franco-Maçonaria. Kellner e Reuss tornaram a O.T.O., pela implementação de certos ritos, independente da Maçonaria e, porque a O.T.O. praticamente era dos dois na morte de Kellner, Reuss liderou. Crowley, de seguida, cedo ganhou o Xº grau. E eis a disposição por graus na Ordem:

Segundo o manifesto M M M

O Minerval
I M.
II M..
III M∴
P∴M∴
IV Companion of the Holy Royal Arch of Enoch.
Prince of Jerusalem.
Knight of the East and of the West.
V Sovereign Prince of Rose Croix. (Knight of the Pelican and Eagle.)
Member of the Senate of Knight Hermetic Philosophers Knights of the Red Eagle.
VI Illustrious Knight (Templar) of the Order of Kadosch, and Companion of the Holy Graal.
Grand Inquisitor Commander, Member of the Grand Tribunal.
Prince of the Royal Secret.
VII Very Illustrious Sovereign Grand Inspector General.
Member of the Supreme Grand Council.
VIII Perfect Pontiff of the Illuminati.
IX Initiate of the Sanctuary of the Gnosis.
X Rex Summus Sanctissimus (Supreme and Most Holy King).

Segundo Oriflamme

I Prüfling [Probationer]
II Minerval
III Johannis-(Craft-) Freimauer [Craft Freemason]
IV Schottischer-(Andreas-) Mauer [Scottish Mason]
V Rose Croix-Mauer
VI Templer-Rosenkreuzer
VII Mystischer Templer
VIII Orientalisher Templer
IX Vollkommener Illuminat [Perfected Illuminatus]
X Supremus Rex

A pessoa que atingiu o décimo grau governa um sector, um pais, uma região ou um grupo linguístico e o O.H.O. governa a Ordem mundialmente. Porém, é natural que apenas os de grau Xº subam a O.H.O. por descendência. Só os Outer Heads é que podem conceder o grau Xº. Em 1915 Crowley começa a aborrecer-se com a O.T.O. e altera o sistema inteiro (a pedido de Reuss) em serviço a mensagem da Thelema. "It is impossible for free men to acknowledge any system which is bound up with the fetishes of savages whose only motive for action is the fear born of their ignorance." Nesta altura existia já outro grau Xº ao qual não é dada muita importância. Reuss governa, como cabeça Nacional, a Itália e Crowley a América (estava, na altura, a viver em Nova York) e eram os dois únicos como cabeças nacionais. Quando Reuss morre, Crowley afirma que nas suas ultimas cartas o mesmo deu sucessão a Crowley como O.H.O., mas esta carta nunca foi encontrada, assim como não foi encontrada carta alguma que indicasse qual o sucessor. De qualquer modo, numa espécie de votação Crowley serviu como O.H.O. desde aqui à sua morte.

sexta-feira, 20 de março de 2009

Subvulvios






Conduziu-a à cama, para, assim embebida, sonhar, e, sabendo que ia sair o seu amante, Samanta segurou o braço que lhe pertencia. Ele segurou a sua mão. “Não antes de te ter, não desta vez. Se podes, deita-te a meu lado, só até que o sono venha.” E ele, não lhe largando as frágeis mãos, chamou pelo porteiro. Era um homem idoso, mas robusto, de longas barbas e óculos igualmente albinos, perfeitamente redondos. Vestia um casaco longo, castanho, e cinzentas calças largas, presas por uma correia ao casaco. Samanta estava nua, e Ornat pediu que, se agachando, ela afastasse as suas pernas, sorvendo, a sua jóia escarlate, o ar carregado da moradia. Antecipando o que viria, deixou a cabeça ao colo entre as pernas de Ornat e este ordenou ao porteiro que a penetrasse. O mesmo, causando a sua vagarosa erecção, sempre servil, obedeceu. Ela apertou as mãos e soltou um pequeno som, fragilizada por demais. “Se me amas realmente, com certeza saberás saber o meu sabor em todos os homens.” Largou os braços, que se suportaram na cama (como que pregados a uma qualquer cruz de tormento), e abandonou a casa.

quinta-feira, 19 de março de 2009

A Caminho da Liberdade




"I see you... I have observed you... For 1000 years, I have observed you!"

"Civilization, old and evil..."

"Does it always smell like this in here?... how does the wind get in here?"

Robert E. Howard



Eu louvo o capitalismo e a obediência cega
- Eu louvo o grande domador de cães selvagens

Eu louvo o pudor
- Eu louvo a força de proibir

Eu louvo o superficialismo, ele é um homem gordo de braços minusculos e sorriso de orelha a orelha
- Eu louvo os que sorriem porque estão a ser observados

Eu louvo a falta de palavra
- Eu louvo os homens de pistola na boca

Eu louvo a mente fechada
- Eu louvo os corações de jaula

Eu louvo o Estado
- Eu louvo os que protegem e servem

Eu louvo a estupidez e a deslealdade
- Eu louvo o sorridente e o distraido que usa como bainha de espada o seu amigo

Eu louvo a ignorância
- Eu louvo o homem atado de pernas e braços

Eu louvo a pequenez
- Porque ela é tudo no mundo

quarta-feira, 18 de março de 2009

A Metade Devorada II




Sentei-me, hoje, de noite escura, naquele sofá habitual constituído simples, por almofada de um sofá de verdade que estava rasgado e envolto de pelo de gato e que foi deposto mesmo ao lado do caixote de lixo na noite antes de aparecer o carro que o recolhe com tantos sons despertando o vazio das ruas do Penteado, uma aldeola entre duas vilas. Depois, outras almofadas que não me recordo de onde vieram, talvez trapos da minha avó, faziam o encosto e, como habitual, confortado por isto pus-me quieto dentro de tudo o que é inconfortável como se fosse conformismo. A música, a tocar baixinho, embalava tudo um pouco numa melancolia perene. Como se fosse preciso um suporte para, simplesmente, sentir. Como se fossemos tão débeis que precisássemos de suportes para sentir. Como se fossemos máquinas frias e fantasmagóricas, inconscientes dentro do vazio gélido do consciente. Pensei que queria desprezando. Pensei que talvez ela pudesse estar ao meu lado. Quem sabe a beijar-me. Pensei que, como em raros momentos, ela podia estar verdadeiramente comigo. Esses eram momentos irreais. Ninguém tem tempo, ninguém tem disponibilidade, por outras palavras, não há coragem para se estar de verdade com alguém. Olha-se por detrás do ombro, com os olhos cegos de gelados, em frente, planeando esculturas de pedra fria e sem expressão, olha-se para dentro para se contemplar a dor, para se agarrar à dor, para se suportar. Continua-se e fim. Ah, se o mundo fosse de um Divino mais vivo, quem sabe, ela pudesse ser mais vivamente aquela divindade de juba solar, vestes de sereia e corpo felino. Nesta divindade fantasmagórica que é, é aquela escultura de Inverno que está descontente mesmo consigo mesma, que se trocou por pedra e nunca ousou olhar ao corpo de fogo. Bonita, não obstante, quão bonita. Sincera, pura, serena, nos seus olhos brilhantes prados sem fim, feitos de paz. No seu sorriso que consigo causar rasga-se uma alegria inabalável ou insuportável e mostra-se a fulgurar. Enfim, pensei em como já dançavas longe porque nunca estiveste senão na imaginação, e o que não? Se existes és um corpo tão celestial e distante quanto uma nuvem bem bela e púrpura de serena, ou de pesadelo aglomerado. A minha mão chega às nuvens, a minha voz controla as nuvens. Tu, inatingível como uma nuvem, presa nas teias bailarinas de uma imaginação mais bela que a própria lua ou tudo o que tem luar. Que um próprio lago ou todos os nenúfares prateados pela noite em sonoridades gotejantes. Aparece. E apareces. E pereces. E imortal. Quantos foram os monstros que te atacaram? Quais os seus nomes? Tu não sabes, tu nunca lhes resgataste os nomes, que pena. Quem tem o nome tem o comando, tem o controle. Quem escreve e é esmagado pelas letras e encoleirado pelas frases escreve as próprias feridas e entrega a si mesmo o abismo indecifrável. Ah, mas tu, só sabes o hálito dessas vis criaturas sob o teu pescoço a aquecê-lo, a adoecer o sangue fermentado. Mas tu só cais e não sabes onde e te ausentas dormente para não sentir quando voltas a cair, sem parar nunca de cair em primeiro lugar. Cais quando te ergues e morres quando cais. Eu sei que o afecto ausente é como um terror presente no afecto, que não sentes, que não és.

Eu esqueci-me e voltei atrás, tu deste-me um livro e estávamos no Pinhal Novo. Tudo brilhava à excepção dos meus pais e da casa e da escuridão e da tua partida longínqua porém iminente. Eu escrevi esse livro e não sei quantas páginas tinha, ou se tinha dor que sei que também tinha mas sei a paz. Enfim, dane-se. Eu queria ver como seria tudo quando tudo estivesse destruído.



* Manipulação de Phallucifer Babalith

terça-feira, 17 de março de 2009

A Teoria do Mundo Infindo



“The ancient tradition that the world will be consumed in fire at the end of six thousand years is true, as I have heard from Hell.
For the cherub with his flaming sword is hereby commanded to leave his guard at tree of life; and when he does, the whole creation will be consumed, and appear infinite and holy, whereas it now appears finite & corrupt.
This will come to pass by an improvement of sensual enjoyment.
But first the notion that man has a body distinct from his soul is to be expunged; this I shall do by printing in the infernal method, by corrosives, which in Hell are salutary and medicinal, melting apparent surfaces away, and displaying the infinite which was hid.
If the doors of perception were cleansed every thing would appear to man as it is, infinite.
For man has closed himself up, till he sees all things thro' narrow chinks of his cavern.”

William Blake




A Noção do Infinito no Finito e a Indiferenciação de Todas as Coisas

Finito

A palavra Finito tem como definição: “completo”, “terminado” e “acabado”, sendo também no italiano, e não o dizemos em vão, sinónimo calão para “morto”.



Infinito

A noção de infinito teve início nas deambulações filosóficas dos gregos, sobre o espaço interminável e as multiplicidades sem fim de mundos, anteriores a Platão e a Aristóteles.
É no século quinto antes de Cristo que Zenão de Elea (discípulo de Paraménides e defensor do Uno) descobre, nos Paradoxos de Zenão, que se aplicarmos a continuidade a um movimento, e o conceito da infinita divisão, matematicamente, esse movimento, como uma unidade, nunca existiu.
O Paradoxo do Estádio diz-nos que, para se atingir uma meta, é necessário primeiro, a titulo de exemplo, atingir-se o ponto intermédio do seu cumprimento, e para se atingir este ponto intermédio, o ponto intermédio, assim sendo até ao infinito. Da mesma forma nos diz a matemática que, de o numero um ao numero dois, existem, depois da virgula, infinitos números, e para chegar ao numero um, ou ao numero dois, ou a qualquer outro numero, um infinito número de operações.
Esta teoria comprova a existência, pelo menos intelectual, do infinito, mas é rebatida quando tenta comprovar a inexistência do finito, ou do seu modo de aplicação. O finito não pode, e nisto o argumento é valido, integrar-se no infinito e permanecer finito, mas, pela divisibilidade, o infinito pode integrar-se no finito.

Isto não o souberam os gregos, e foi com o horror do movimento, o horror do infinito, e a degradação do número que as formas de pensar pitagóricas foram abandonadas e uma barreira separou os filósofos da realidade. Só com o renascimento viria o infinito a reaparecer.

ELP. Como é possível que o universo seja infinito?
FIL. Como é possível que o universo seja finito?
ELP. Julgam que se pode demonstrar essa infini¬dade?
FIL. Julgam que se pode demonstrar essa finidade ?
ELP. De que extensão falas?
FIL. E tu de que limites falas?
(Giordano Bruno, 1984, p. 27)

FIL. Em suma, indo directamente ao assunto, parece-me ridículo dizer-se que fora do céu está o nada, que o céu está em si próprio, localizado por acidente, e é lugar por acidente, idest com respeito às suas partes, E seja como for que se interprete o seu «por acidente», não se pode fugir a que se faça de um, dois; porque sempre é uma coisa o continente, e outra o conteúdo, e tanto assim é, que para ele próprio o continente é incorpóreo, e o conteúdo é corpo o continente é imóvel, o conteúdo móvel; o continente matemático, o conteúdo físico. Ora, seja essa superfície o que se quiser, nunca me cansarei de perguntar: o que é que está para além dela? Se se responde que está o nada, então direi ser o vácuo, o inane, e um tal vácuo, um tal inane que não tem limite nem qualquer termo ulterior, tendo porém limite e fim no lado de cá. É mais difícil imaginar isto que pensar ser o universo infinito e imenso, porque não podemos fugir ao vácuo se quisermos admitir o universo finito. Vejamos agora, se é possível que exista o tal espaço em que nada está. Neste espaço infinito encontra-se este universo (por acaso, ou por necessidade, ou providência, por enquanto não nos interessa). Pergunto se este espaço, que contém o mundo, tem maior faculdade de conter um mundo do que outro espaço qualquer, existente mais além.
(Bruno, 1984, p. 29-32)

FIL. Para a solução do que procuras resolver, deves primeiro considerar que, se o universo é infinito e imóvel, não há necessidade de procurar o seu motor. Segundo, que sendo infinitos os mundos nele contidos, tais como as terras, os fogos e outras espécies de corpos chamados astros, todos se movem pelo principio interno que é a própria alma, como noutro lugar provámos; por isso é escusado andar a investigar o seu motor extrínseco. Terceiro, que estes corpos mundanos se movem na região etérea e não estão pendurados ou pregados a qualquer corpo, assim como esta terra, que sendo um deles, não está fixa em parte alguma; a qual demonstrámos girar à volta do próprio centro e em torno do sol, movida pelo instinto animal interno. Enunciadas tais advertências, segundo os nossos princípios, não somos obrigados a demonstrar o movimento activo, nem o passivo duma eficiência infinita, intensiva, pois que são infinitos o móvel e o motor, e a alma movente e o corpo movido concorrem num sujeito finito, isto é, em cada um dos ditos astros mundanos. Tanto assim, que o primeiro princípio não é o que move; mas, quieto e imóvel, proporciona o movimento a infinitos e inumeráveis mundos, grandes e pequenos animais postos na amplíssima região do universo, tendo cada um deles, segundo a condição da própria eficiência, a razão da mobilidade, mudança e outros acidentes.
(Bruno, 1984, p. 45-46)

E diz Galileu:
“Salviati: Se te perguntar quantos são os quadrados perfeitos, podes responder-me, sem mentir, que são tantos quantas as suas raízes quadradas; visto que todo o quadrado tem a sua raíz e que toda a raíz o seu quadrado, não há nenhum quadrado que tenha mais de uma raíz nem uma raíz que tenha mais de um quadrado.”
Simplício: O que há a decidir nesta situação?”
Salviati: Não vejo outra solução que não seja a de que todos os números são infinitos; que os quadrados são infinitos; e que a imensidão dos quadrados não é menor que a de todos os números, nem maior, e, em conclusão, que os atributos de igualdade, maior que e menor que, não têm lugar no infinito, mas só nas quantidades finitas.”

Mas Galileu pensou que, porque o infinito se comportava de forma diversa de tudo o resto, devia ser, a título da eficiência de cálculo e da ordenação intelectual do mundo, evitado, teoria simpatizada por Gauss, no século XIX:

“Protesto contra o uso de uma quantidade infinita como sendo uma entidade de facto; isto nunca é permitido em matemática. O infinito é só uma maneira de falar, na qual se fala correctamente de limites para os quais certas razões se aproximam tanto quanto desejarmos, ao passo que outras crescem sem limite.”




O Finito, o Infinito, e a Indiferenciação

A palavra porta, e o conceito que carrega, traduz-se numa definição finita. A porta é um objecto cuja utilidade é ora abrir passagem ora fechar passagem a um ou vários homens e mulheres, independentemente do material do qual é constituído (pode ser uma porta de madeira, de ferro, de aço, e.t.c.). Porém, o objecto em si, além da abordagem pela sua utilidade, terá, de si, limites? A porta não é sem as paredes e as divisões, assim o diríamos. Mas, imagine-se que se retirava uma porta de um quarto e suspendia-se a mesma no céu, sem paredes e divisões, permaneceria uma porta e, a sua utilidade a mesma, se a porta está fechada não se passa através dela (embora se possa contornar pelo céu) e se está aberta atravessa-se. Se retiramos o céu, a amplitude, as paredes e as divisões, deixa de ser possível prosseguir o raciocínio, porque sem espaço (virtual ou real) para a porta, a porta não existe. Se considerarmos que o céu é infinito, a porta pode ainda ser colocada no céu, mas se retirarmos a porta, a terra, a estrela, os astros, e qualquer referência igualmente e aparentemente finita, o céu perde a concepção, sendo o céu (e/ou o infinito) aplicado a cada uma. A este nível, o céu pode ainda ser colocado na porta (não dizemos, com isto, que a porta é o céu e que a porta é infinita, mas que uma caracteristica da porta é o céu e o infinito).

A diferença e a pluralidade é sustentada pelo raciocínio que nos dita que todas as coisas estão separadas (pela diferenciação, a nível do intelecto, pelo espaço e pela eventualidade a nível físico), e se um espaço e um tempo existem onde se possam assim espalhar, um espaço e um tempo existem em que estão intrinsecamente unidas (este espaço, este tempo, e este intelecto, em si mesmos). A porta, embora seja uma porta e nada mais, não acaba na porta, tem continuidade no seu contexto, que tem continuidade no seu contexto, e assim o livro que se situa no solo e que se pode encontrar uma vez a porta transposta. Sob este prisma, nesta característica cada objecto é um símbolo igual e um símbolo vivo (em movimento de expansão) para o infinito, mesmo que um livro seja um livro e a sua utilidade a leitura, e uma porta e a sua utilidade o zelo da segurança e da privacidade.

segunda-feira, 16 de março de 2009

Do Pó Viemos







Na década de 2000 a Academia Russa da Ciência, o instituto alemão Max Planck e a Universidade de Sydney descobrem memória na matéria inorgânica, e a capacidade do pó galáctico formar hélices e duplas hélices. O Conselho de Investigação Nacional dos Estados Unidos, está a estudar as formas de vida inorgânica na Terra (organismos sem ADN). O pó não orgânico, em forma de plasma e gravidade zero, forma as estruturas do ADN, conexas por força electromagnética.


Pai, eu vi o pó, e os homens pensavam que o pó era à semelhança da morte. E a morte pensou os homens como pó. E os homens, o pó, e a Morte, eram um, excepto no Espírito Santo, que tocou as coisas intocadas.

Ajuda-me a entender, Pai, tu que abres sempre uma clareira quando o caos é cerrado e a esperança vã, porque se move o que morreu em tempos, porque toma o barro vida, e porque empalidece o espírito, e gela, onde a morte toma força? A vida que conhecemos, como a conhecemos, termina hoje. Eu inscrevo o teu nome com o meu sangue, e não o meu, que o espelho apagou.

sábado, 14 de março de 2009

Joker




Have you ever danced with the devil in the pale moonlight?

The Joker




Sempre que as trevas me visitavam sem convite, quando eu punha todos os sinais de proibido, vinham com rosto de palhaços, nos sonhos, palhaços profetas, depois, a minha vida desmoronava toda. Tudo era impossível de ser realidade na dor da realidade. Depois, adormecia lentamente, e davam-me a beber qualquer coisa que me fazia acordar sem saber bem de que noite, porque a noite era quando se fechava os olhos do rosto, e os olhos da mente e os olhos da emoção. Só a alma é que há de saber dessas noites.

Depois... Enquanto acontecia, descobri uma coisa, pranteava muito, por vezes sorria, e como já tudo era muito grande, nada cabia nos sorrisos nem nas lágrimas, e meio louco, comecei a rir-me mais, rir-me de ironia, depois rir-me de escárnio. E percebi uma coisa, o mundo não cabe na mão, nem no pranto, mas o mundo cabia, sim, num riso de escárnio.

Eu tinha muito medo do palhaço, depois, o palhaço riu-se em mim em vez de se rir de mim.

O Palhaço ri-se de tudo o que eu nunca me riria, se eu não risse já com ele.

Ás vezes riu-me como quem dá um fatal tiro na cabeça e vê o mundo rodar e dançar finalmente.

Mesmo que fosse a aranha que teceu as estrelas, uma cara branca havia de se rir por detrás do negro do espaço, havia de ser um riso que se ria de mim e que se ria em mim rompendo-me todo.

Já fui tantas mascaras e ainda sou, porque por detrás da mascara não há ninguém como o conhecemos, e mesmo assim, nunca me consigo disfarçar perante o Joker, nem quando me visto de Joker...

Talvez esse riso desse rosto seja o vidro do Espelho como o lado de lá do Oceano que têm uma Noite uma Mãe. Mas não ver o reflexo no espelho é o primeiro sinal do Espelho. Não ver o reflexo no espelho é o primeiro sinal do Espelho não ver o reflexo no espelho é o primeiro sinal do Espelho.. não ver o reflexo no espelho é o primeiro sinal do Espelho. Porque os mortos quando caminham no Templo dela, caminham por túneis e sempre de costas, não a olham, tem ainda muito medo de morrer.

Porque olhar para a morte não é olhar, é deitar os olhos à Taça.

O Mundo é uma Febre. E mesmo quando tudo se cala, até o zumbido do silêncio, ele a rir-se, tão cristalino... tão impiedosamente cristalino.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Integridade





“O monstro não é aquele sem moral, neutro, cheio de clareza, mas todos os monstros são abortos da moral”

Horned Wolf




I

Onde Crowley (num dos seus momentos de estupidez) falha o Nietzsche:

"We have a sentimental idea of self-sacrifice, the kind which is most esteemed by the vulgar and is the essence of popular Christianity. It is the sacrifice of the strong to the weak. This is wholly against the principles of evolution. [...] There is here a conflict between private and public morality. We should not protect the weak and the vicious from the results of their inferiority. By doing so, we perpetuate the elements of dissolution in our own social body. We should rather aid nature by subjecting every newcomer to the most rigorous tests of his fitness to deal with his environment. The human race grew in stature and intelligence as long as the individual prowess achieved security, so that the strongest and cleverest people were able to reproduce their kind in the best conditions. But when security became general through the operation of altruism the most degenerate of the people were often the offspring of the strongest."— Confessions (Ch. 49):

Com este Darwinismo Social, as hienas formam bando e muitas vezes devoram o leão. Aqui dizemos “forte” para disfarçar “as maiorias”, e dizemos “o fraco” para camuflar “o discriminado por parte das maiorias”, e derivados, assim desfavorecendo o indivíduo, procurando prejudicar a Estrela.



II

O Liberalismo

"O escocês Adam Smith (1723-1790) expôs a teoria de que os individuos poderiam estruturar a sua vida económica e moral sem se restringirem às intenções do Estado, e pelo contrário, de que as nações seriam tanto mais fortes e prósperas quanto mais permitissem que os individuos pudessem viver de acordo com a sua própria iniciativa."

"o conceito basico da liberdade foi criado durante a Idade Antiga na Grecia, na Idade Média as cidades italianas revoltaram-se contra os Estados Pontifícios papais debaixo da bandeira da "liberdade"

"A resistência holandesa ao opressivo catolicismo espanhol é frequentemente apontada como outro exemplo; apesar da recusa em conceder liberdade de culto aos católicos, é usualmente considerado uma luta predecessora dos valores liberais."

"O Liberalismo pode encontrar algumas de suas raízes no humanismo que se iniciou com a contestação da autoridade das igrejas oficiais durante a Renascença"


"O liberalismo defende uma sociedade caracterizada pela livre iniciativa"



III

Ensino

A escola foca-se em dois aspectos: o caracter cientifico, e o caracter moral (sob o nome também de religioso), o ultimo, afasta-se mais da alma do que o primeiro, na sua busca pelo Mistério. As duas, porém, são dirigidas ao intelecto, podem proporcionar capacidade de argumentação e facilidade no calculo, mas não podem conceder nobreza de alma. Podem ensinar uma pessoa a saber como pensar no seu meio ambiente, e que regras deve ou seguir ou contornar, mas não impedem o homem de todos os actos vis. Alguns dos homens mais perversos foram alguns dos homens mais inteligentes, precisamente porque tinham educação suficiente para chegar longe. Os valores não nascem de regras, os valores brotam do espírito.

A unica forma de ensinar a alma de outrém, é por via da inspiração e da genialidade: a religião e moral é um desvio que procura atribuir ao intelecto qualidades que não lhe pertencem, qualidades que pertencem à alma e ao génio. O intelecto conhece a lógica (e as quantidades), a alma a nobreza (as qualidades).

O intelecto pode expandir os nossos horizontes, e à medida que este é o objectivo da ciência, temos um efeito contrario de coagulação por parte da religião e moral.
Mas só a Experiencia pode intensificar a Consciência.

O que é que faz de um homem um homem melhor afinal? A AUTO-REALIZAÇÃO. Penso que este se tornou termo esquecido, enquanto a ciência progride e se discutem códigos de ética, e ao mesmo tempo se afirma que não temos qualquer razão de ser, porque, como numa corrida de ratos, escondendo o panico, corremos na escuridão sem qualquer paradeiro, sem qualquer integridade nem significado. O HOMEM REALIZADO em si mesmo, pode ser desprezado pela sua sociedade, mas vive satisfeito e oferece ao proximo, porque abundando, jorra. O homem sem auto-realização, ainda que bem sucedido será sempre um infeliz, empenhado em fazer o proximo igualmente infeliz.

Mas nenhum homem chega à auto-realização sem antes se despir de quaisquer intremedios e pre-conceitos sobre a sua percepção do mundo, porque ela é a união directa da alma a esse Universo.

A um homem digno não importa recompensa ou punição, importa a Realização. E esta educação cientifica e moral não é, realmente, uma educação, mas um misto de instrução e domesticação.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Gótico Arquitectónico






Na época do renascimento, no período dos séculos XII e XIII, nasce um novo tipo de arte, o gótico, que acaba por substituir a arte romana.

Gótico era (para os humanistas italianos do renascimento) associado aos godos, que eram os bárbaros.

Chamava-se gótico a tudo o que era considerado estranho na altura.

A arte gótica expandiu-se por todo o tipo de arte, do que se vai falar a seguir é da arte arquitectónica gótica.

As grandes catedrais góticas, as chamadas Norte’d’Dame ou, nossas senhoras, eram construídas para embelezar a cidade, para as tornar mais majestosas e também para atrair visitantes, para haver maior fluxo económico na cidade, também servia para mostrar a riqueza de cada cidade.

As catedrais góticas (monumentos góticos) eram constituídas por muitas janelas, por grandes torres, e grandes altitudes (para chegar até ao céu que era onde estava Deus) e estas tinham as paredes menos grossas em comparação com as catedrais e igrejas romanas e possuíam vidrais que na altura eram de um alto valor comercial (dai o cuidado de mostrar a riqueza da cidade).

Quando um senhor importante da cidade morria, este doava todos os seus bens para a Igreja, não só para se redimir dos seus pecados, mas para ajudar na construção da catedral.

Os monumentos (catedrais) góticos eram sempre em forma de cruz, embora se assemelhassem mais com a forma de um Ankh pois acabavam sempre em ogiva, ou seja, redondas em cima.

Em Portugal, Santarém, é chamada da Capital do Gótico, e é lá que se encontra uma das obras primas do gótico, a Igreja de Nossa Senhora da Graça, fundada em 1830.

A Luz que passa pelos vitrais, enquanto se funde, cria um ambience místico e sagrado, pois a luz é a voz do divino e a manifestação do sobrenatural. A altura das paredes nas catedrais permite que o carácter simbólico e o efeito da luz se fortifiquem no seu verticalismo: em vez das paredes funcionarem como apoio, elevam aos ares nas asas da luz.

Na base da ideologia presente na arquitectura gótica está o principio de que é possível chegar a Deus não só pela fé como pela razão. A altura das catedrais surge como indicativo de que o homem enganou, pela razão e pela fé, a gravidade e alcançou o Céu.

É um retorno à Torre de Babel.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Saúda os Manequins






De pó e fumo é a garganta da Luz, e a sua Palavra uma vingança.







Os olhos são o ponto de solidão dos videntes, e nada está onde é.



Nos meus braços carrego a morte, e tornam-se asas pela sabedoria.




Não tem fundo, a boca que devora o silêncio, e nem o coração limite.



Saudarás o Senhor no Trono, e deixarás de pesar sobre ti mesmo.





-Imagens de Aion

segunda-feira, 9 de março de 2009

Fantasma Cansado




o frio chegou e ele tomou a ardência do vinho

depois da solidão a companhia das memorias

atormentou-o e confortou-o

então as memorias exaustas da ausência

voltaram para casa no seu esquecimento pueril

depois ficou o gelo

ficaram os ossos frios

sem historia ou recordação.

Vampirismo





A Subcultura

A Subcultura, muitas vezes referida como a “cena vampyrica”, é um movimento contra-cultura contemporâneo recentemente propagado na Europa e na América. Os membros pertencentes ao movimento, designados de vampyros, em nome da demarcação do vampiro, na identificação com o estilo de vida real em lugar do mítico, não se consideram, não obstante, como sendo totalmente humanos. Ou nascem nesta condição, ou penetram os seus mistérios pela via ritualista da iniciação, esta envolvendo a utilização sanguínea ou sexual. Acima de tudo, o Vampyro demarca-se da cultura vigente pela sua expressão pessoal e pelo culto ao seu próprio individualismo, entre os quais se encontram os que se denominam a si mesmos como sendo anjos da escuridão, num apelo ao simbolismo do que jaz, eternamente, entre a luz da redenção, e o sangue da danação.

O amor desta subcultura afigura-se na teatralidade, no expressionismo, no convívio, no erotismo, no ocultismo, no poder do sangue, no instinto grupal, e no critério pessoal de cada um.

É, apesar de tudo, indefinida a natureza do vampyro, devido à anarquia e à disputa sobre a realidade da “cena” por parte dos variados membros, reinando por conseguinte a inconsistência e, quase sempre, o superficialismo tanto como a falta de maturidade cultural como esotérica.

Enquanto alguns se ocupam de beber sangue, outros dignam-se de roubar energia psíquica, existem ainda aqueles que, acreditando apenas em si mesmos, na sua condição de semi-deuses, permitem-se a indulgência de todos os seus desejos.

A nível sociológico, a industrialização social, rejeitando todos aqueles que se recusam a submeter à desumanização corrente, é zombada pelo movimento presente, na mesma figura não humana e demasiado humana, do vampiro. O vampyro, é assim, e esta descrição é das poucas coisas válidas a nivel da sapiência esotérica, um ente que entende profundamente a realidade humana, de uma forma suficientemente aprofundada para se situar além dos seus limites.

Entre os vários indivíduos da subcultura, encontram-se aqueles que se alimentam por razões aditivas, de necessidade, e os que consideram o metabolismo em estudo uma experiência de liberdade espiritual, procurando-se, em todo o caso, uma quebra ao tabu e ao preconceito no sentido geral. Dentre as entidades mais respeitadas, realçam-se, em estatuto, aquelas que utilizam a Ankh, conectada à deidade egípcia ISIS e simbolizando tanto a imortalidade (símbolo do indivíduo independente de um poder superior) como o poder exercido sobre a morte. (Comprem uma ankh, gente, faz maravilhas - já o crucifixo com estes marotos não nos vai impedir de ser entediados)

O vampyro encara assim o mito do vampiro como um arquétipo, vivido e compreendido em si mesmo na qualidade intelectual, associando-o à magia, e, usualmente, ao arquétipo de Satanás, incluindo o seu estado na danação do ponto de vista católico ou de outras religiões dominantes. Esta concepção de mal encontra-se, por sua vez, ligada ao poder politico conseguido pelo medo, pela repressão, pela irracionalidade, e pela ignorância do estado mais livre e primário inerente no próprio ser humano, criatura predatória, como se constata pela proximidade dos olhos que constituem o seu canal de visão. A face lunar, visceral metamórfica, feminina, felina, vaidosamente nocturna, dionisíaca e sexual na criatura humana, é, por conseguinte, o aspecto vampyrico da mesma, desencontrado da sociedade moralista (hoje em dia é mais hipócrita mesmo) que, presentemente, vivemos.

São incluídos, como identidades da subcultura, aqueles que pesquisam e escrevem sobre o assunto, aqueles que o abordam pela estética e pela moda, os que ingerem sangue, os que abordam a vertente por via do fetichismo sexual, os que se alimentam da psique e da emoção, da força anímica e vital, sendo a fome presente acreditada como uma insuficiência, uma deficiência que quase sempre, origina de nascença, mas apenas desperta na época da adolescência.

Realizando uma abordagem o mais resumida possível do tema, os métodos variam entre a energia adquirida por intermédio do sexo, dos centros vitais e do sistema nervoso, dos processos dados a nível inconsciente, e por intermédio das variações emocionais.




Historia

Foi nos Estados Unidos da América, por volta de 1975, que um coventículo explorador dos aspectos mais obscuros do paganismo, nomeado de House Sahajaza, representou os primeiros indícios do que viria a ser o vampyrismo. No mesmo ano, o Temple ov Set instaurou um grupo de elite de nome Order of Vampire, consagrado ao estudo e à prática do vampirismo. No ano seguinte, Anne Rice, autora de vários romances, humaniza a figura do vampiro.

De seguida, nos anos oitenta, a subcultura gótica desenvolve, tanto nos EUA, como na Europa, inúmeras referências à temática do vampiro e é no meio da década de oitenta que são relatados os primeiros grupos de indivíduos que viviam a subcultura vampyrica, ainda de um modo bastante hermético.

O Vampiro, não se destina ao vampyro, e muito menos a qualquer subcultura. O nosso Vampiro é nobre, solitário, discreto, e mestre dos seus instintos. No vampyro, ele vislumbra unicamente, a mais absurda das presas.

sábado, 7 de março de 2009

Subvúlvios




Foi durante o Reinado de uma dita rainha Sofia, que Ornat Tebunah, um conde de mérito, estabeleceu, isolando-se na sua moradia, o seu próprio lugar no mundo, com imunidade por qualquer dos seus feitos.

Tido, primeiro, como poeta de alta qualidade e artista-mor do seu próprio cabaré, tanto nas artes musicais como no desempenho teatral em palco, este foi então procurado pelas muitas almas perdidas que vagueavam sem razão ou estrela guia, na procura do auto-conhecimento.





I

Entre o lusco-fumo da bruma da demência do sono e do estado desperto, Ornat fez-se notar na porta aberta que permitia brancura entornar-se e mesclar-se em ares de meia-luz, pela sua ampla casa, e movendo-se pouco, da sua beliche real observou a mulher de cabelo carmesim selvagem, no seu rosto arredondado, decorado de dois bonitos olhos tamanhosos, e de um corpo carnudo sem ainda a mácula da glutonisse.

“Psst”, chamou. Falando baixinho, porque os habitantes da casa, em retiro, se deixavam ainda inebriados pela sonolência, a mulher balbuciou qualquer coisa como o seu desejo de marcar um tempo a sós com o aristocrata. Por entre o seu cabelo negro, que se aparentava, sempre, húmido, os olhos azuis-escuros não largaram a mulher durante um momento mudo. “Minha senhora, afirmo que traz consigo o cheiro citadino das maquinas de lata e da pestilência dos muitos moribundos, pedintes do dia-a-dia, e porém não inteiramente, o cheiro de uma mulher. Alguma vez provou uma?” Calada, ele percebeu o seu não, e, expirando o cansaço provindo do seu descanso, desceu a degraus lentos do seu leito. Tomou o braço da senhora perfumada, e levou-a para a cama a seguir à sua. Através de lençóis escuros e transparentes, ela observou um corpo feminino, seios perfeitamente redondos, em copa, miraculados de mamilos doridos e encarnados, abdominais mais macios e ondulados do que as areias desérticas, coxas alvas, capazes de eclipsar a graciosidade do cisne, os pés sensualmente almofadados, lábios sequiosos, pestanas adormecidas num qualquer sonho erótico, cabelo áureo, faces tenras e coradas. “Mas, senhor, não está ainda na hora de abrir a casa. Voltarei mais tarde, dos meus afazeres.” Puxou, procurando libertação. Sossegadamente, ele sentou-a primeiro, passando os seus dedos por detrás da sua orelha, então, com as duas mãos envoltas na sua cintura, deitou-a. Beijou-lhe a face ao frémito da respiração tremeluzente. E tomou forma outra, corpo nu, pontiagudo de concupiscência, deixou os dedos, a perna barbeada e o joelho acima, percorrerem a fragilidade da mulher até ao centro púbico, passando à de leve brisa de borboleta o seu toque mágico de mão, passeando-a em pequenos furacões pelo peito e pelo pescoço desprotegido. Ao lado, a mulher despertava, gemendo entre os mundos. Ornat ergueu-se, voltando, como uma fera antes camuflada, à sua forma habitual. A mulher, suplicante, repleta de desejo e sentindo o cheiro aos fluidos nocturnos daquela que ali prolongara a noite, fitou-a, com o olhar de uma presa imersa no seu destino. Ornat, deixando o compartimento, sussurrou para si mesmo “É política da casa deixar-se algo, quando nela se entra”.

sexta-feira, 6 de março de 2009

Sunless





1977: Cientistas descobrem organismos situados na profundidade do oceano. Estes extraem o calor da água quente, rica em mineral, que se eleva do chão oceânico.

1999: Um cientista sugere a existência de planetas habitáveis na sombra, improváveis de detectar por instrumentos.



Fito, parado, o esgar movimentado das águas.
O perfume do ferro e do magnésio
A altura da lua, em qual gravidade
O calor da terra espelha a vida
Sem Sol, cego, cego, uma sombra
Nas miríades do Universo.

Tusso, convulso, o gás de hidrogénio,
A radioactividade fervente
Que me permite a liquidez do sangue.
Arrefece a luz, a respiração,
A pele, mas nós somos tudo
O que o Inverno já foi
E no gelo da historia
Assombraremos a memória acabada.

A Morte escapou com o Sol
Órfãos de deusa, órfãos de deus,
Brilhamos, com a luz de quem não vê,
E as nossas preces ecoam,
a solidão que sobrevoam.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Feitiços de Inverno






I
Dói demais, saber que és senão um porquê, os mil braços apagados, olhares em fogo sufocados, amor que já não se vê. Não vai acabar, nós vamos ser sempre o luar, a respiração ofegante de uma noite hesitante onde nenhum de nós decidiu hesitar (a respiração ofegante de uma noite hesitante que nunca quis acabar). A tua mão aperta-me desde o âmago no peito, tu estás morta e eu sou o teu leito. Sou sentir-te perto de mim e tudo decepado e eu um ser mutilado e sem fim. Não vai acabar; vamos ser sempre um coração só e uma luz e uma paixão. Meu corpo é teu cadáver e tu, viva, és tremura de mão.


II
Descrevo a minha descendência de onde parei, descendendo. Que os anjos mortos e sepultados, cegos e estrangulados, cantem, de línguas decepadas, os sopranos ao meu lamento. Ao grito da minha ausência de voz. Os dias que passam são tristezas que barram a minha casca de frio e indiferença. A pior dor é a de não nos ser permitido usar o coração ou sequer tê-lo ou sequer dá-lo. É forçar-nos a desfigura-lo e transforma-lo numa parede sem face e sem expressão, descolorida de tudo. Que vários assassinatos à mão divina e que as legiões lupinas do tempo que perseguem e despedaçam tudo presenciem a minha morte, os brilhares fugazes e impressos da minha morte onde só há o meu escrever.


III
Sou alguém que se arrasta nas ruelas de viver. Sou um sonho que se afasta, nas ruas a perecer…


Trechos retirados de um livro que escrevi ha muito muito tempo, ainda Jesus era Menino e a Morte uma Criança.
Homenagem a Vitany.

A Palavra da Cinza


Tudo se mistura em riso, até as estrelas são uma teia de gargalhadas sonoras, e o caos a sua estrutura. Entre a disrupção, como cal nas rachas das paredes brancas, formam-se doutrinas, crenças, algomerados de pensamentos, todos nascidos gémeos e assassinos do seu irmão, depositários da semente da anulação ou da roda sem cessas. O fogo sexual, de que só os animais tomam conhecimento, vem lavar as paredes...Depois, na ventilação da memória, tudo começa quando todo o pensar solta espectros putridos que dançam por volta da chama, e a única vida é o silêncio virgem, um silêncio só tocado pela lingua mais incandescente, cuja palavra é cinza.

Violino Sem Cordas




Um beijo. Sonolento, arrebatado pela doçura, um beijo. O silencio. Não bebi sangue. Foi um beijo, atrever-me-ia a dizer um beijo como qualquer outro. Ao Sol, os corrimões amarelos e a vista da praia de Sesimbra. O azul. Ele estava perto da máquina de escrever. As cortinas de céu. Os lábios de homem, ásperos e com feridas. Os meus lábios de rapaz. O vermelho incandescente dos pés da escrivaninha, um incêndio. A ausência de sangue e a velhice eterna. O cheiro de sovacos. O fim das noites, de todas as noites desde então, gravado no meu rosto.

Os seus dedos já não tocavam piano. Incapazes de tocar piano. As pombas acumulam-se dentro da casa. Cortaram a luz. O ruído surdo das asas. A lentidão das penas.

A boca trémula e os lábios que se afundaram nos lábios. Os lábios que se derrocaram nas gengivas. O ruído vivo da dor. Só conheço os meus olhos fechados. As pombas morrem. A casa inteira-se de esqueletos de pomba. O ruído seco do chilreio de pardais, como agulhas. As mãos brancas na minha saia. Nas minhas pernas de rapaz.

O nosso sangue é o silêncio. O som surdo do rapazito. Devorado em sucessivas pausas movimentadas. Não haviam manchas no cadeirão. Carne podre. Fria. Fecho os olhos. O rosto de todos os fins a procriar mais um. Foram felizes.

A boca é a secura onde morrem as chamas. O estalido do silêncio. Observo nos espelhos. Ela chora. São tantas as vozes. Ela chora. Muitos os lamentos. Ninguém escuta todas as suas vozes. Os seus dedos tocam piano. O silêncio das teclas. O silêncio do desejo. O silêncio do desejo de ouvir a melodia. A madeira surda do piano. Alegria. Peso absurdo. Imóvel. A surdina dos lábios esfarelados. A boca esfarelada nos seus dedos débeis. Tentei ser gigante e pedra e estrela. Cinzento. Uma explosão branca de cinzento. Pés. Pernas. Coxas. Um cadeado em redor do pescoço do rapaz. Ela move-se sem som. Diz, se ele pergunta, que o seduz e nada se ouve. Silêncio. Azul e magenta. Encaixados. Um cadeado em redor do pescoço do rapaz. Fechado. Completo. Ranhura na cintura. Observo nos orifícios. Os meus olhos são covas abertas. Observo. Branco. Sem o sossego negro das vestes. Tornaram-se cinza. Ele odeia-a. O rapazito. Odeia-a. Quer come-la. Ela. Abre os lábios e geme e o som invade a casa e desfaço-me contra as paredes mudas. As estrelas. Riem-se de mim. Apatia. Os dedos dele. As suculências húmidas. Procuram. Serpentes sem sangue. A mão. A mão do rapazito. Cheia de cabelos. Cheia de cabelos do rapazito. Já não tocavam piano. Incapazes de tocar piano. As pombas acumulam-se dentro da casa.

São Borondon






Quando o Atlântico reflecte o Sol,
A ilha de San Borondon
À força de um luminoso lençol
Espreita, nos olhos de Sebastião
Em que, por obra da devassidão
Se perde, e as suas pobres gentes
A nação.

No ancoradouro da sua melancolia
Relembra nos seus erros
O fim da primazia
Com que os ventos escutavam
Ibéricos, as almas uivantes
De glória, orgulho e vitória.

A cruzada, pensa, cedo devia
Haver sido abandonada
E não devia o rei ter havido
Qual jesuíta, e se o rancor
Da fé maldita, não proliferasse
De terror vaidoso, e se apagasse…
A luz, não da razão, nem crença
Mas do amor pelo sangue e região
Lavado tinha os olhos
Das escamas da cegueira
Breve, letal e mui certeira.

De si, de Dom Sebastião,
Não resta outra religião
Senão a hedonística, da ilha
E do amor às coisas da terra
Que, se nos nutre, é sempre santa
Como calor nos dá o fogo
Do sangue e do coração,
Da alma e da razão.

Fita, ele e mais alguns
A península do fim do Reino
E espera que o Mundo passe
E os exércitos se reúnam
Debaixo do seu estandarte.

Não conquistareis terras
Mas por terras conquistados
E guardareis a vida
Contra toda a fé estrangeira
À própria vida
Que é passageira.



* Homenagem seja feita a um homem que ama essa divindade que é a Lusitânia: Klatuu.

Dark Cinderella (Humor para Duendes)



Longínquo no tempo, Cinderella, uma órfã prostituta foi apadrinhada na casa de uma ilustre rainha, cujo marido, conhecido nas artes libertinas, possuía, bastardas, duas esbeltas filhas, presentes na sua corte de horrores nocturnos (ou deveria dizer... prazeres?). Estas suas irmãs de artifício, penteavam e pintavam a menina como se trabalhassem uma boneca de louça. Vestiam-na de boneca, vestido de boneca, sapatinho de boneca, e instigavam a sua depravação adolescente.

Cedo, a Cinderella, de perícia nos seus afazeres, tornou-se na principal serva sexual da corte.

Uma noite, o Rei, cujo vulto de leviandade se agitava e agigantava no reino, e que esperara pacientemente os avanços na arte por parte da sua filha adoptiva, concedeu-lhe a sua cama. E Cinderella dormia com o rei e com a rainha, sempre exposta aos seus desejos e sem o descanso que é próprio a uma jovem.

Cedo, a rainha, ao lume do ciúme, exilou-a, fazendo do seu ninho de sono o curral. Mas Cinderella tinha um coração suado de bondade, e as suas irmãs continuavam a usufruir dos seus serviços. Cinderella agradava, apesar de suja.

"As tuas roupas parecem-se com culotes menstruados" provocava uma, enquanto as removia, "e a tua cara como um balde de lama" a outra, enquanto a beijava. Então elas comeriam os chocolates e observariam enquanto Cinderella lhes lambia a suculência.

Agora, porque as irmãs, ardentes, desejavam o rei e o poder que vem com o rei, envenenaram a sua esposa e, ao escutar as novas da morte da rainha, riram, como as hienas riem, quando na euforia da fome.

O Rei, todavia, não conseguia tirar de si o desgosto, e muito menos emancipar-se nas suas preciosas bastardas. Mandou que se chamasse Cinderella, lavou-a, e depois, na companhia da sedutora, dançou suavemente toda a noite, e permitiu-se o luxo das lágrimas. Quando o seu semblante recuperado, pousou o olhar no da menina, apercebeu-se do significado do seu destino. "Tens de ser tu. Tu substituirás a minha esposa." Despiu-lhe as roupas de boneca e substituiu-as pelas esplendorosas, que vestia a rainha. Deixou para ultimo a coroa, que assentava na perfeição, e depois os sapatos. Mas o pé de Cinderella não cabia. O pavor invadiu a mente poderosa do rei, e depois de cinco minutos de silêncio e reflexão, com a faca, tomou a comedida resolução de cerrar os pés da menina à medida, então encaixando-lhe os sapatos ensopados no jorro quente. Após o primeiro sapato embutido, a rapariga, lamentando-se, conseguiu a fuga.

Deformada e escoando vida, correu pelo reino, não conseguindo apagar de si o terror. O povo falava de uma assombração, um demónio que se disfarçava da falecida rainha, e conversavam alegremente entre si sobre como a haviam apedrejado até ao seu ultimo sopro. Em celebre festa, queimaram pois o seu cadáver.

O Rei casou com uma das suas filhas bastardas e viveram felizes para sempre.




* Imagem de byluluka

Cânticos



I

Neófito,
A quem olhaste, quando, pela primeira vez, se abriram os teus olhos?
O deserto, a primeira coisa. O deserto foi a primeira coisa que tocou os teus olhos.
Néofito ! Sobre o que caminhas?
Quem te fornece a fome da qual extrais a voz dos anjos?
Quem é o teu pai?
O deserto.
E se o vendaval da noite rasga a areia
E, a areia engole o Sol no seu abraço incandescente
No seu oceano de gelo
Tu és o seu filho.


II

E neófito,
É na pedra que encontrarás exemplo,
Ela não cresce, não pode ser comida,
Nem mesmo bebida
Ela nada pede,
A pedra é perfeita
Como as coisas sozinhas podem ser perfeitas.


III

Meu neófito,
Consegues ver o cantil?
E agora o meu turbante?
O cantil não é um turbante
E nem o turbante procura ser cantil,
No mundo, cada coisa é o seu objecto.
Mas tu, tu pertences ao Anjo
E no mundo disfarçarás o cantil, o turbante,
O assassino, o curandeiro,
E todas as coisas roubadas.
Por isso, sempre que o Sol Nasce,
Deves subir a duna e sauda-lo
Porque o Sol se mascara de tudo o que a luz
Atinge, e não se divide.
Dorme então e sonha
A multiplicidade das formas,
Mas quando o beijo frio da Noite
Tocar a terra, vigía
E alimenta-te do silêncio da morte,
Só assim permanecerás no Mundo.


IV

E só, neófito,
Quando o cabelo prateado
Com que vieste à bruma
Se tornar fraco e quebradiço,
E o teu riso poderoso
Como o fim do uni-verso
E souberes de cor
Os segredos do vento
Deverás tu ensinar
Os filhos dos homens
E devorar os seus vícios
Na boca do deserto.

Os Sinos






Fecho os meus olhos durante muito tempo, há muito tempo, e os momentos passam, passam como mundos que, em sequência, se desmancham aos meus pés na forma móvel de mil berlindes negros. Aceito-os e ignoro-os. Por debaixo das minhas pálpebras cerradas, fecho mais o olhar, os meus olhos choram pétalas de cravo e esperam que o perfume te atraia. As pétalas desenham um pequeno círculo, um pequeno altar no solo. Dentro da taça, acendo a vela. Desvio o olhar do espelho e descubro o sangue onde pétalas haviam. O sangue, responsável por tudo o que é único e imortal, o sangue que mata e o sangue que ressuscita, o sangue, esse, que pode fazer a neve e o gelo serem quentes ao toque, esse sangue, todo ele, vertido no cálice do teu olhar.

Alongo-me a fitar a taça. Ela contém os vultos bailarinos do meu inferno. Ecos:

Estou sentado num divã, nu, como me apresento sempre a ti, e a minha pele brilha, tremeluzente com as velas. Escuto Wagner e tenho um cigarro nas mãos, que tresandam a vida e morte. Olho o círculo de pétalas de cravo em que se empareda e dança o escorpião. Os mundos que caiem e se dividem, ficam suspensos, no interior do círculo. Desvio o olhar do espelho. A taça abriga o Universo em ecos. Em ecos…

Pergunto-te porquê? Porque me renegaste à sombra? Tem pelo menos a piedade de me esclarecer, de me retirar das mãos esganadas desta agonia. Eu fui tocado pelo amor do teu olhar mas os homens desprezam-me. A mim, que presenciei mais do que poderiam… sim, estava a espreguiçar-se debaixo da lua, com os gatos. E eu… atacou-me uma fraqueza, fui esmagado pela minha ânsia e cai no chão, uivando. A partir daí os meus dias tem sido um inferno. O mundo é aborrecido, populado de criaturas aborrecidas, eu sou, sobretudo eu, aborrecido, e espero pelo tempo da loucura, das orgias e das cidades incendiadas. O tempo em que o mundo volte a apelar pela tua justiça.





* A imagem é uma manipulação de Phallucifer

O Porteiro





Passaram algumas luas desde que não sei dizer se estou de pé, ou sentado, nem mesmo se se apressam os meus passos, se corro. Estou parado, ainda que gire sobre mim mesmo com a agitação nocturna das folhas sombreadas pela ventania e dos ratos que percorrem as veias do castelo; que a minha cabeça embata na parede, repetidamente, para cheirar o sangue e calar as minhas meditações. São as questões, as inquisições, as perguntas de todos, de tantos, a olharem para mim e a procurarem respostas, parados, fixos. A tocarem-me. Todos queriam saber de mim, de mim porque eu era aquele que nunca indagava. Depois, quando todos partiam e os ultimos ecos dos ultimos passos abandonavam o pátio, eu escutava só as pedras da parede e o vento entre as fendas, e o ruido seco da palha e até a melodia da lua, se brilhava com força suficiente. A Lua tinha o som dos lagos parados. Os cisnes voavam de noite, e escutava os sussurros das suas asas. Nessas noites, não dormia, porque também não sentia necessidade de acordar...

Tudo se repetia, o estrondo mudo do sol, a palavra do calor, depois os olhares, os passos, os lábios movidos e as linguas revolvidas (as humidades cintilantes), os gestos fernéticos que não ilustravam nada senão um nervosismo continuo e desconexo. Os ultimos ecos dos ultimos passos no pátio, que era o último pátio do mundo. O pôr do sol (cujo ruido se assemelha a um rio, talvez mais próximo de um riacho), e então a noite e as suas criaturas, a maior delas, como um predador sublime, sendo o próprio silêncio. Um dia, não veio ninguém. Não houve passos nos corredores nem vozes no pátio, não houve indagações nem olhares intrometidos. A primeira coisa que mudou, após esse sórdido acontecimento, foi que o ruido do sol passou sempre a ser o ruido do sol-pôr, principalmente quando nascia. A luz passou a ser inquietante, como multidões sem fim, multidões de asas de cisne em meu redor, num bater de asas histérico e absurdo. Tapei todas as janelas com tábuas, e as portas com panos negros, de veludo negro. As velas perdi-as pelo escuro, no frio solo. Esfarelei-as, ao encontra-las, entre as unhas por cortar e a robutez das mãos sujas. Depois percebi, quando, nos ruidos nocturnos, e desses, primeiro nos cisnes, escutava os sussurros de gente, primeiro difusos e dificeis de perceber, depois indagações várias sobre tudo, a fazer parecer o mundo ser tantas coisas em vez de uma só coisa.

Os aldeões dizem que eu sou acabrunhado por um demónio a que apelidam de Legião. Trazem-me chá quente, que me acalme a febre, e sacos de água quente para me aquecer, vinho para beber e ração de cão para comer. Mas eu não os vejo, e desconfio que caminho já como os cães. Não consigo ter a certeza se me movo verticalmente ou horizontalmente. Não sei, mesmo, se ainda urino ou obro, e se o faço, onde e de que forma, parece-me até que como gente, ou que fornico os mastins esfomeados, e uma única certeza me resta: ser a Porta e a Voz do Mundo.

Os Filhos da Noite







Imagine-se...
Uma época de silêncio ouvido, de palavra sem som, aí, quando abriamos os olhos e os fechavamos, estávamos dentro uns dos outros, para sempre. E a nossa palavra não era muda, porque era sem estrondo, porque era sem mil sombras, porque era o escuro e o escuro era a luz.

Então veio uma luz outra, um louco que sai de casa em pleno dia, de lanterna na mão (como Nietzsche ilustra) e nos diz, "Deus está morto, nós matámo-lo". O iluminismo, que nos deu lanternas a todos e deixamos de ser objectos dessa historia do silencio falado, passamos a ser os sujeitos, isolados, sozinhos, quase inteiros, metade devorados. Um "penso logo existo" e, qual facada final, somos orfãos. Os outros são objectos da nossa luz, não são conosco, são debaixo de nós, nunca nos satisfarão, nunca olharão para nós como se não fossem meras marionetas, imagens de espelho. Na treva da iluminação frouxa, o mundo inteiro é um abismo, em todas as direcções. Tudo o que está próximo nos mutila a identidade, nos interrompe conosco próprios, como um monstro engasgado nos seus próprios tentáculos.

Este desespero auto-centrado cedo leva a democracia à mediocracia, a razão perde lugar para o ceder ao dizer afectado, à voz ruidosa, se antes viamos os naufrágios com o conforto da contemplação, agora afundamos também, e afundamos na noite, sem nunca deixarmos de nos observar, nem no último momento. De um moderno para o pós-moderno eis-nos, os nossos concertos, os nossos livros, os nossos amigos, rituais quotidianos que nos arrepiam, sem qualquer significado. Estamos a ser devorados constantemente pelo próprio ar, se me tocas mato-te. Começou por alguém parado, a chorar, num banco... As pessoas pararam por ela mas ela não as via, ofuscava-a a lanterna. A seguir todos começaram a fazer o mesmo, e deixou de haver olhares. Ficou apenas o olhar do abismo, meia duzia de rabiscos esotéricos e herméticos, cerveja, para passar o tempo enquanto esperamos morrer.

Faltou-nos um sentido para as coisas, e se antes achavamos que eramos os exilados da Jerusalem - enquanto o procuravamos -, passamos a se-lo efectivamente, quando, sem ter tido respostas, deixamos de ter perguntas. A noite caia mais completamente, ou melhor, nós caiamos nela, engolidos pelo céu. Somos insensiveis, somos indiferentes, porque a indiferença foi o nosso pai e a nossa mãe; emocionamo-nos totalmente num acto masturbatório e ejaculamos para a sarjeta.

Cortamos os pulsos, e sentimos finalmente o olhar do Outro, o horror do outro, inviolável, incontrolável. O Outro. Bastou-Lhe um olhar, quando pequenos, para nos cegar. E do limite ao limiar, estendem-se as mãos do anjo.

Olho-te como uma menina, o teu punho fechado, trémulo mas firme, a tua expressão armagurada e o fogo dos teus olhos, que te incendeia e te queima. O teu punho fechado no teu sangue, erguido no ar, no formato de um coração sangrento.

Ah, se a abrisses, o mundo a teus pés.

Que a Noite nunca faça faltar o amor para com os seus filhos.


*dedicado a Beatriz Hierro

Alegoria de Nietzsche




Observei os monstros.
Os monstros dividem-se em dois. Aqueles monstros que atiram pedras aos monstros, e aqueles monstros que recebem as pedras e as comem, e se habituam a come-las.
Dediquei-me a humanos e a monstros e os humanos receberam-me e deitaram-me fora, precisavam de sangue e de coisas da terra e eu era demasiado angélico.
Os monstros agarraram-se a mim. Que lealdade era esta? Que tipo de vampirismo? Que pena eu senti. Eu disse: todos os monstros estão sozinhos, os que atiram as pedras e os que recebem as pedras, e tu agora nunca mais precisas de estar sozinho. Eu vou comer pedras contigo e contigo eu vou atirar pedras. E tu vais ver que és um anjo, como eu, és um anjo. Os monstros são anjos que os humanos comeram, porque os humanos não comem pedras, alimentam-se antes de carne viva e de anjos, e que deitaram fora como assim o exige o aparelho digestivo.
Algures no meio da merda eu hei de retratar as asas, e quando voltarem a acreditar em asas, a dormência abandonará as vossas, e as pedras serão rosas e as rosas lampiões para iluminar os homens.
Por isso eu transformei as minhas asas em cinza e disse: "nunca ninguém derrubará esta essência do fogo".
Os monstros fitaram-me longamente, a arremassarem-me como uma pedra e a comer-me como pedra e os humanos compadeceram-se de mim, porque me tornei estrume de monstro e de homem e nenhum anjo, se alguma vez lembrou, se lembra de mim.
* dedicado a Gotik Raal

Cadáver Sem Nome




It starts once upon a time,
with all the frogs in line,
whispering, singing,
alive and kicking.

All that and...
sincerely awaiting for
the eggs to etch.

I want to fly away
from here and there,
with a cigarette
in my mouth
of sorrow and a weeping throat.


*Cadaver de HornedWolf e pUnChdRuNk-LoVeSiCk

O Mundo Sem Capitalismo I






Vou dividir este post em dois, e no primeiro, vou escrever sobre como foi possível viver sem o capitalismo. No segundo, como é, ainda, possível viver sem o capitalismo, pelo menos dentro de uma perspectiva consumista, em que nós próprios somos – mas sempre o fomos, devo pois antes dizer -, devemos ser produtos de venda. Um capitalismo em que qualquer um que não se encontre nestes parâmetros, é um alvo a abater.

O passado:

Julius Evola falava da Luz do Norte, de uma virilidade espiritual e de uma soberania olimpiana. Falamos também dos tempos em que a autoridade e o ícone da integridade era tanto divino como temporal, como temos ilustração nos faraós e nos imperadores. Segue-se o tempo dos monarcas em que o poder é simbolizado no líder militar, no guerreiro. Aqui o sangue é a honra, e esta honra a bandeira a ser seguida. Com o sangue, como Evola sabe ilustrar e muito bem, a lealdade, a fidelidade, e o dever.

Esta passagem da autoridade espiritual para a autoridade militar e política pode ser bem expandida com Max Webber, embora num prisma mais anárquico. Para Max Webber, o espírito do homem, de cada homem, movia-se num veio magico-mitico, de primordialidade e interacção com o divino, sendo que o advento a que chama de “desencantamento do mundo” se pôs com a racionalização e o intelectualismo destas mesmas relações entre o homem e o sobrenatural, criando pois a religião e uma forma monopolizada de coerção de um homem sobre o outro, e se Evola ilustra a passagem do espiritual ao sangue, do divino ao guerreiro, webber fala-nos da passagem do feiticeiro ao sacerdote, do espírito ao politico. De seguida, das doutrinas religiosas passa-se a um quase niilismo científico, este desencantamento que continua a levar o homem a suplicar por um significado espiritual que o preencha, quando na antiguidade interagia naturalmente com esse significado, havendo trocado presentemente o sentimento de realização pelo sentimento da própria suplica. Estas são as características do capitalismo. Á semelhança deste exemplo, o capitalismo afirma que o homem, em comunidade, deve viver como um canibal de forma a sobreviver, quando na verdade o canibal há muito que sobrevive para comer.

“uma das limitações da ciência mais difíceis de aceitar é justamente essa sua incapacidade de nos salvar, de nos lavar a alma, de nos dizer o sentido da vida num mundo que ela desvela e confirma não tendo em si, objectivamente, sentido algum”

O segundo colapso deu-se quando se trocou o sangue pelo papel, e a honra pelas notas. A autoridade abandonou o guerreiro e escolheu o mercador. Com a revolução burguesa, o contrato social deixou de contemplar a honra e a fidelidade para abraçar a economia e o utilitarismo. A democracia mascarou a tirania do rico sobre o pobre, por debaixo de bandeiras de liberdade e igualdade. O banqueiro e o industrialista na linha da frente das nações europeias. Até que, com a exaltação das classes baixas, o ideal passa a ser o trabalho e apenas o trabalho, quer este seja intelectual ou físico, e nunca o acto livre, independente, o trabalhar e nunca o Agir, sendo o chicote que impulsiona o escravo, num mundo capitalista e consumista, o vizinho, e aquele individuo pelo qual passámos na rua; se paramos para agir como livres pensadores, é assim que diz o mito, eles devoram-nos. O mundo, diz-nos esse mito, é uma máquina trituradora e a alternativa a movermo-nos ao seu ritmo é a morte ou a miséria.

“Os princípios dominantes do homem são aqueles da parte material das hierarquias tradicionais: ouro e trabalho. Isto é como as coisas são hoje; estes dois elementos, quase sem excepção, afectam cada possibilidade de existência” Julius Evola

“The only demand that property recognizes, is its own gluttonous appetite for greater wealth, because wealth means power; the power to subdue, to crush, to exploit, the power to enslave, to outrage, to degrade, turning the producer into a mere particle of a machine, with less will and decision than his master of steel and iron.” Emma Goldman – Anarchism and Other Essays



E prosseguindo, como Ernst Jünger explicaria no seu Anarch, a liberdade é a marca da liderança humana, dando o exemplo de Sócrates, que não era livre apenas por si mesmo, mas por todo o povo. Assim os grandes lideres militares eram seguidos e admirados pelo seu povo, eram, também, os poetas épicos do acto. A barbárie, seria, pois, um estado mais nobre e natural do que um capitalismo dissimulado. A liberdade espiritual e a espiritualidade marca o ser humano e distingue-o do animal, a inteligência sendo apenas uma forma aguçada do instinto. O Estado não é uma marca humana nem natural porque não é uma marca livre nem espiritual, mas é um produto intelectual que não estava cá, e que poderá voltar a deixar de estar.

“Once connected with life, the formative principles repeat themselves. They float as germs, as possibilities in life's undifferentiated stream. This explains the constantly repeated attempts at state-building in the coelenterates, all the way from the primeval animals. Freedom in the spiritual sense first entered into the stream of life with man. From now on freedom also cannot be lost. In this respect we can concur with Hegel.”

Ainda, Novalis acredita no medievalismo monárquico mas sobretudo clerical, em que a cristandade devolveria o encantamento a essa Europa desencantada de Webber, pela unidade numa só doutrina e num só conjunto de crenças, unindo numa religiosidade mística a economia, a politica, a cultura e a sociedade, conferindo simultaneamente transcendência social.

“Belos, esplêndidos tempos: a Europa era terra cristã, e a Cristandade habitava una este recanto de mundo humanamente configurado...”

A entrada do capitalismo, do mundo dos negócios e da instrumentalização mercantil e a doença visceral pela propriedade, numa visão do mundo sem poesia, magia, ou espiritualidade, vem contaminar a Europa.

E com isto Novalis dá-nos uma das citações mais góticas e pós-iluministas que eu conheci:

“O ódio à Religião (...) transforma a música do universo, infinita e criadora, em um matraquear uniforme de um moinho monstruoso que é impulsionado pela tempestade do acaso e, nadando sobre ela, é um moinho em si, sem arquitecto ou moleiro, e na verdade um autêntico perpetuum mobile, um moinho que mói a si mesmo”


Interessante é todavia observar o panorama actual, e ver na sombra desse caos a luva da Luz que vem, essa Luz do Norte, passagem do caos para a primordialidade, liberdade e verdade. Se, de certa forma, o intelectualismo exagerado marcou a nossa queda da Era Dourada, e o homem continuou depois a “cair” ao ponto da supressão desse próprio intelectualismo para a desordem e a confusão, no silêncio que segue os estoiros o véu deixará de arder para que o homem possa novamente ser fogo.



"I must create a system or be enslaved by another mans; I will not reason and compare: my business is to create." - William Blake

"Capitalism is the astounding belief that the most wickedest of men will do the most wickedest of things for the greatest good of everyone." - John Maynard Keynes

Sede


Poetas mortos nos rochedos. Observo nos espelhos. Sem roupa, o corpo mudo e carnudo. Com vergonha. Rubor sem som. Oferece uma concha. O vazio a ecoar. Ela estende a mão nua. Os ossos por debaixo. O azul. Ardor nos globos brancos. Ela esticada com formas. Apanha o objecto. O vazio a ecoar com força. Sentem-se felizes. É como se a praia fosse deles. De noite, nas paragens do silencio do tempo. A noite é deles. A solidão. Sentem-se felizes. Juventude eterna. Todos os fins a procriarem mais um. Frio. A tremer. Os tendões a gritar. Aponta para uma estrela. Faz dela uma concha. A luz gritante da estrela no silencio dela. Odeio-me. Os lábios cerrados. Todo eu. Os lábios cerrados. Engolidos. As memórias não salvam. Ela canta nos meus olhos. A minha vida é nos olhos cerrados. A intensidade febril dos bichos da madeira. O silencio azul. A madrugada sem testemunha. Ela. O pé despido fincado na areia. Ele. Comparam as pegadas. Ele. Ri-se. O ruído das ondas. Ri-se. Ouço só as vagas. A espuma. Apatia. Quero rasgar tudo. Observo nos espelhos. Os ossos. Os ossos estavam vibrantes. As pernas eram velozes. Correm. A areia. Entulho. Madeira negra. A flutuar no mar. Riem-se, surdos. Quero gritar. Observo nos espelhos. O azul. O silêncio. O sangue. Os ossos. Riem-se. Surdos. O entulho. Queimam o entulho. Frio fugidio. As mãos, sempre uma na outra. Bailam. Os dedos. Ele adora os dedos. Fome de viver. O roupeiro. A intensidade febril dos bichos da madeira. Destroços. Sentem-se felizes. Juventude eterna. Magia. Testemunhas da madrugada. Ruído contínuo da luz. Agulhas. Pardais. Neblina. Os dedos, e ele a adorar os dedos. Ela. Está quieta, atenta ao respirar do rapaz. Queimam o entulho. Fogo. Escuto-o e não tem som nem calor. Deitam-se. Em redor da luz. Como agulhas. Lutam, riem. Não alcanço as vagas. Não consigo dormir. O sussurro desassossegado das vagas. Sem ar. Beijam-se. Beijam-se. Beijam-se. O azul. Observo nos espelhos. Beijam-se. Os lábios sumidos. Fantasmas secos. O azul das lágrimas. Lua. Observo. Frio avassalador. A neblina. A neblina limpa tudo. O gelo das noites. Sentem-se felizes. O estrondo mudo das vagas, do fogo. Observo nos espelhos. O gelo das estrelas. Suspiros longínquos, como garras. Os nossos beijos. Fantasmas molhados. Como qualquer outro.



* imagem de Phallucifer Babalith